Descoberta de exoplaneta amplia compreensão sobre o Universo

O observatório utilizado na descoberta foi o de Calar Alto, na Espanha // Ilustração: Richard Fiorio da Cunha

Uma equipe que reúne cientistas de diversos países detectou o planeta que orbita uma anã vermelha do tipo M, classificação mais frequente das estrelas em nossa galáxia. No entanto, os corpos celestes usualmente encontrados em suas órbitas são pequenos e rochosos, tudo que o GJ 3512b não é. O estudo deste caso abre novos caminhos para melhorar nossa percepção do Cosmos. “É assim que a ciência avança, as teorias vão sendo reformuladas em função das descobertas”, diz a professora do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, Jane Gregorio-Heten.

Este ano os astrônomos Michel Mayor e Didier Queloz receberam o Prêmio Nobel de Física pela descoberta, em 1995, do primeiro planeta fora do nosso sistema solar. Embora este não tenha sido realmente o primeiro exoplaneta, foi o que ganhou esse reconhecimento já que os outros dois, encontrados em 1992, orbitavam uma estrela morta e foram considerados uma anomalia.

O ponto é que o feito deu início a uma revolução na astronomia, mais de 4.000 planetas que não orbitam o nosso Sol foram descobertos desde então. Novos mundos de diferentes tamanhos, formatos, massas e órbitas, nos mais variados cantos da Via Láctea. É o caso do exoplaneta GJ 3512b, que se encontra a cerca de 30 anos-luz da terra e está intrigando astrônomos.

O exoplaneta tem quase a metade do tamanho de Júpiter, o gigante gasoso do nosso sistema solar, e sua massa é 270 vezes menor que a da estrela em que orbita. O número parece grande, mas para efeito de comparação, Júpiter é cerca de 1.050 vezes menos massivo do que o Sol. A surpresa dos cientistas se dá pelo fato de que até então, era pouco provável que um sistema com uma estrela tão pequena fosse capaz de sustentar um planeta tão grande. 

“Isso prova que o nosso sistema solar não é um padrão, existem outros tipos de distribuição planetária. Como alguns que se parecem com nossos gigantes gasosos, por exemplo, mas que se encontram muito perto da estrela. Isso é o contrário do que vemos no nosso sistema”, conta Jane.

Ganhadores do Prêmio Nobel de Física em 2019, Didier Queloz e Michel Mayor // Foto: L. Weinstein/Ciel et Espace Photos

As teorias em questão

A ideia geral em relação à formação de estrelas e sistemas planetários é que uma nuvem interestelar, dentro da nossa própria galáxia, composta por gás e poeira em alta concentração tende a fazer com que seus componentes se contraiam e rotacionem. “Com esses movimentos juntos, para manter o equilíbrio e a conservação do momento angular, a tendência da matéria é se achatar”, diz a professora. 

No centro forma-se um corpo, com maior quantidade de massa indo em sua direção, e o resto da matéria se distribui em um plano equatorial. “A estrela então fica no centro, e o plano ao seu redor é onde os planetas serão formados, o que nós chamamos de disco protoplanetário”, explica Jane. E as diferentes hipóteses sobre formação de planetas tentam solucionar o que acontece a partir desse disco.

Segundo a professora, a teoria mais divulgada é a da composição do nosso sistema solar, chamada de acreção. “Imagina o disco como sendo um prato visto de cima, algumas regiões começam a ter falhas circulares nos locais onde planetas se formam e concentram a matéria que estava em sua órbita. Depois eles se distribuem de modo que os rochosos fiquem mais próximos da estrela e os gasosos mais longe, onde as temperaturas são menores.”

O sistema formado pela anã vermelha e seu planeta gigante, contudo, contraria essa teoria e favorece uma outra, o que surpreendeu os pesquisadores. “Existem outras hipóteses para o surgimento de planetas. Os cientistas que estudam o caso defendem uma menos conhecida para explicá-lo, a da instabilidade do disco protoplanetário”, diz Jane.

Como a descoberta aconteceu

A professora explica que esses achados não acontecem ao acaso. Os pesquisadores normalmente têm uma lista de estrelas candidatas, com indícios de terem outro corpo ao seu redor. Escolhe-se uma de acordo com o que se quer estudar, sejam estrelas parecidas com o sol, muito diferentes, ou ainda, sistemas binários, compostos por duas estrelas que orbitam entre si. 

Mais de 4.000 exoplanetas já foram registrados pela NASA até hoje // Vídeo: SYSTEM Sounds (M. Russo, A. Santaguida)

“Nesse caso eles provavelmente estavam em busca de sistemas diferentes do nosso, se depararam com essa anã vermelha, a monitoraram e verificaram variações no que nós chamamos de velocidade radial”, conta Jane. A velocidade radial é calculada através do espectro de luz que essa estrela emite, e indica se o corpo tem ou não movimento em relação à Terra. “Se esse deslocamento não existir, a posição das linhas espectrais produzidas em laboratório deve ser a mesma que as emitidas pela estrela. Se houver diferença significa que o corpo está oscilando.”

Esse movimento denuncia a possível existência de um planeta que interfere na gravidade dessa estrela. Além de possibilitar, por meio de cálculos, que se suponham as características desse astro, como sua massa, seu tamanho e sua órbita. “Existem outros métodos para se identificar a presença de um planeta, mais eles são ainda mais difíceis, pois dependem de equipamentos de altíssima precisão”, ressalta Jane. 

O futuro científico 

“Não é que esses casos mais exóticos não existiam, é só que a gente não conseguia identificá-los com essa facilidade”, conta a professora. Para ela, o mais interessante disso tudo são os avanços tecnológicos que permitem esse tipo de descoberta. 

O fato é que não se pode ter um modelo único no campo da astronomia, e os avanços científicos caminham com as inovações tecnológicas. “Vamos encontrar coisas ainda mais diferentes. E isso não quer dizer necessariamente que uma teoria vai ser descartada e outra favorecida, cada caso vai ter sua própria explicação. E na verdade, o Universo é melhor entendido por meio de uma combinação de todas essas suposições”, completa Jane.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*