Se a Turma do Balão Mágico pudesse pegar carona em uma cauda de cometa para ver a Via Láctea, como seria essa estrada tão bonita? Não se sabe tudo o que há por aí, mas uma coisa é certa: não estamos sozinhos. Vida alienígena? Nada cientificamente comprovado, mas pelo menos a Terra não é o único planeta existente. Mas isso é de conhecimento geral: outros sete planetas dividem conosco a energia do Sol. Porém, existem outras estrelas além do Astro-Rei, e outros planetas próximos a eles, os chamados exoplanetas.
Eles começaram a ser detectados nos anos 1990 e, de lá pra cá, cerca de três mil foram registrados. Existem muitas semelhanças e diferenças entre eles e os nossos oito velhos conhecidos com nomes de deuses romanos, e estudá-las pode nos ajudar a entender como o nosso sistema solar se formou. Foi essa área que Luiz Alberto de Paula estudou em seu doutorado no Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, cujo título é “Elaboração de um modelo para a formação planetária no código FARGO3D”.
A existência de planetas do tamanho de Júpiter, gigantes e gasosos, em órbitas próximas à estrela intrigou cientistas. Graças a essa localização, suas temperaturas são elevadas e eles receberam o nome de Júpiteres Quentes. O desafio foi, então, entender como planetas tão grandes se formaram em uma região que dispõe de tão pouco material, porque lá a temperatura é tão alta que as partículas não conseguem se condensar.
Atualmente, os cientistas consideram dois modelos para um planeta se formar: por instabilidade gravitacional, que ocorre através do colapso de uma nuvem de gás, e por acreção com núcleo sólido. Acreção é a capacidade que um corpo tem de ganhar massa. Esse segundo modelo é utilizado para explicar as origens no nosso sistema solar e funciona assim: partículas vão se unindo por força gravitacional e formam um núcleo sólido que, quando atinge uma determinada massa, passa a atrair gás e rochas do seu entorno de forma cada vez mais rápida até que se forme um planeta gigante.
O modelo de acreção com núcleo sólido é usado para explicar a existência desses Júpiteres Quentes, uma vez que o modelo de instabilidade gravitacional não dá conta de explicar a variedade de massas observadas para esses planetas (sim, as massas deles variam ao longo do tempo). Porém, ainda assim, o modelo adotado é incompleto. É necessário considerar também outros processos físicos que podem ocorrer, as migrações planetárias, que acontecem quando um planeta se forma mais afastado da estrela e se desloca até próximo a ela. Luiz estudou o processo de interação com o disco de gás em torno do planeta, que, por ser muito complexo, é difícil de se obter com modelos analíticos. Para fazer as análises, é preciso utilizar um simulador hidrodinâmico chamado FARGO3D. No entanto, esse programa analisa apenas a interação do planeta com o disco de gás, e não tem um modelo para verificar esse fenômeno em conjunto com a formação planetária, ou seja, quando um planeta se forma e se move simultaneamente. Luiz criou, então, um código para acompanhar os dois processos juntos. Essa incrementação ajudará nos estudos de outros pesquisadores.
Usando esse novo algoritmo, o cientista pegou um planeta como modelo para estudar os dois fenômenos. Descobriu-se, então, que a linha de gelo é um fator muito importante. “A linha de gelo é responsável por dividir o disco em duas regiões: uma região mais quente e uma mais fria”. Na primeira, há menos material por causa da evaporação, portanto, quando chega lá, o planeta ganha menos massa. Os estudos de Luiz mostraram que, quando o planeta entra na linha de gelo com uma massa próxima da massa crítica, isto é, quando ele começa a ganhar massa, ele consegue diminuir sua velocidade, mantendo-se próximo da estrela, mas sem cair nela.
“Planetas pequenos sofrem um processo de migração chamado tipo I, que é rápido. Já os planetas grandes abrem um buraco no disco, o que torna o acontecimento mais lento”, explica o astrônomo. Para que haja tempo para mudar o processo de migração, o planeta precisa atravessar a linha de gelo próximo da massa crítica.
O pesquisador comenta que seu trabalho, usando o simulador hidrodinâmico, é o primeiro do Brasil, e que os estudos em migração planetária, uma área dentro da astrofísica, são relativamente recentes, pois as capacidades técnicas necessárias para detecção de exoplanetas só foram conquistadas nos anos 1990. Luiz aponta que entender como outros sistemas solares se formaram ajudará a compreender o surgimento do nosso próprio sistema solar.
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