50 anos do Metrô: Pesquisadores da USP defendem transporte sobre trilhos para uma mobilidade sustentável

Pesquisa também chama atenção para desvio de fundos voltados ao transporte público em detrimento de medidas rodoviaristas

Primeira viagem de Metrô no Brasil, em 14 de setembro de 1974. Foto: Reprodução/TV Globo

Em setembro de 2024, o Metrô de São Paulo completou meio século de operação, desde sua viagem inaugural na Linha 1-Azul, entre as estações Jabaquara e Vila Mariana. Ao longo desse período, 33,6 bilhões de passageiros utilizaram a rede, que continua a ser uma alternativa vital para a mobilidade na cidade. 

Estes números, de levantamento do G1, levam em conta a movimentação nas linhas 1-Azul, 2-Verde, 3-Vermelha e 15-Prata, ainda administradas pelo Metrô, além da Linha 5-Lilás, que foi operada pela Companhia entre 2002 e 2018, antes de ser concedida à iniciativa privada.

O marco histórico, porém, levanta questionamentos sobre o futuro do transporte público na capital, especialmente diante dos desafios ambientais e do trânsito caótico. Para pesquisadores e urbanistas da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, a priorização do transporte sobre trilhos é central à sustentabilidade urbana e à redução nas emissões de poluentes.

Raquel Rolnik, professora e prefeita do campus USP do Butantã, enfatizou no artigo Cidade poluidora, clima urgente: o enfrentamento da poluição do ar em plena crise climática em São Paulo, publicado pelo LabCidade, Laboratório Espaço Público e Direito à Cidade da FAU, que “a única maneira viável de enfrentar a crise climática e os desafios de mobilidade é investir nos sistemas de transporte sobre trilhos.” Segundo ela, o problema central das emissões que agravam o efeito estufa está na “queima de combustíveis fósseis por veículos motorizados,” mas mesmo os carros elétricos e ônibus não eliminam o problema, pois “a fricção dos pneus no asfalto ainda libera material particulado na atmosfera.”

Daniel Santini, coordenador da Fundação Rosa Luxemburgo, mestre e doutorando pela FAU, chama atenção para as recentes mudanças nas diretrizes de uso do Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb), que priorizam obras rodoviaristas em detrimento de soluções voltadas para o transporte público eficiente. Em seu artigo Sobre asfalto e pontes: o rodoviarismo no Fundurb, ele alerta para a descaracterização de regras estabelecidas no Plano Diretor Estratégico de São Paulo, que preveem o alocamento de fundos obtidos pelas outorgas onerosas da cidade para mobilidade ativa e habitação. Essa mudança ocorreu em 2019, quando um substitutivo ao Projeto de Lei nº 513/2019 foi promulgado como Lei nº 17.217/2019, e incluiu a possibilidade de gastos em “implantação e realização de melhorias nas vias estruturais”. 

A nova redação vigorou até 2022, quando foi considerada ilegal, mas foi novamente implantada em março de 2023, a partir do Projeto de Lei nº 115/2023, e segue em vigor desde então. Ele argumenta que “as mudanças não apenas representam um retrocesso em um momento em que a cidade necessita de transformação em sua abordagem de mobilidade sustentável, mas também agrava os problemas de poluição e saúde pública.” Segundo ele, essas alterações priorizaram obras viárias, como asfaltamento e alargamento de vias. “A legislação federal prevê que os recursos públicos devem ser destinados ao transporte público coletivo e à mobilidade ativa, mas o que se vê são recursos do Fundurb sendo usados para recapeamento e alargamento de avenidas.”

Investimentos nas estruturas de transporte da cidade de São Paulo privilegiaram, a partir das mudanças, a infraestrutura viária. Gráfico: Daniel Santini, em Sobre asfalto e pontes: o rodoviarismo no Fundurb

Para o pesquisador, essas medidas não só contrariam o princípio legal de priorização da mobilidade não motorizada e transporte coletivo, mas também são pouco eficientes para solucionar o problema do trânsito na cidade. “Ao contrário do senso comum, piora o trânsito. Quando crio mais estrutura para carros e motos, vou ter mais carros e motos circulando. Isso gera um efeito que parece um contrassenso, mas, quanto mais espaço para carros, temos mais carros e o trânsito piora, não melhora. A melhor solução para congestionamentos é fortalecer o transporte público coletivo, preferencialmente transporte sobre trilhos. Não dá para ignorar que a melhor maneira de deslocar milhares de pessoas são os sistemas sobre trilhos, inclusive em termos ambientais ecológicos de uso de energia.”

Quanto à possibilidade de melhoria na eficiência do sistema sobre trilhos, Santini acrescentou que “a solução passa por um planejamento metropolitano mais amplo e pela redução da dependência de rodovias.” O pesquisador defende a necessidade de expandir e integrar as redes de trilhos na cidade para oferecer uma alternativa real ao transporte rodoviário e melhorar a eficiência no deslocamento de pessoas. Além disso, Santini também alerta que decisões políticas que priorizam o rodoviarismo “não devem ser aceitas passivamente como meras soluções técnicas.”

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