A dissertação de Pedro Henrique Barcarolo, defendida na Faculdade de Educação da USP, propõe uma abordagem inovadora para o ensino de matemática: o uso de brincadeiras como estratégia pedagógica para promover o letramento estatístico. A pesquisa foi realizada em uma escola pública de São Paulo com alunos do 7º ano do Ensino Fundamental e se baseou em seis oficinas interativas utilizando a brincadeira “Rio Vermelho”.
O estudo parte do princípio de que o letramento estatístico vai além do domínio técnico da matemática. Ele exige a capacidade de interpretar, criticar e utilizar dados de forma consciente, habilidades fundamentais em um mundo onde a informação estatística influencia decisões políticas e sociais. Para Barcarolo, essas competências podem ser melhor desenvolvidas quando integradas a práticas lúdicas, capazes de engajar os alunos e estimular o pensamento crítico.
“O que mais me surpreendeu foi a capacidade de fazer relações com a vida real deles. Eles se permitiram a se divertir, mas ao mesmo tempo com o passar das oficinas foi incrível ver a qualidade de relações que eles faziam. Todos os grupos engajaram, participaram de todos os passos sem resistência e com compromisso”, relatou Barcarolo.
Com um enfoque qualitativo e baseado em pesquisa-ação, a dissertação estruturou encontros que mesclaram brincadeiras, rodas de conversa e atividades práticas, onde os alunos puderam coletar, analisar e interpretar dados. Durante o processo, os estudantes não apenas aprenderam conceitos como gráficos e probabilidades, mas também foram incentivados a refletir sobre o impacto social da estatística, como sua aplicação em temas de desigualdade e cidadania.
Os resultados demonstraram que o uso intencional das brincadeiras contribuiu para a construção de competências como autonomia, diálogo e pensamento crítico. A brincadeira “Rio Vermelho” serviu como porta de entrada para esses cenários investigativos, onde a ludicidade permitiu que os alunos superassem barreiras emocionais e cognitivas frequentemente associadas à matemática.
Mais do que uma metodologia inovadora, a pesquisa aponta para a necessidade de repensar práticas educacionais, especialmente no contexto brasileiro, onde o ensino de estatística ainda é subvalorizado. Barcarolo argumenta que a inclusão de práticas lúdicas intencionais pode democratizar o acesso ao conhecimento, fortalecer a cidadania e combater a violência simbólica que muitas vezes exclui estudantes de contextos vulneráveis.
“O primeiro impacto é desmistificar esse ‘medo’ e ‘trava’ que a matéria ‘matemática’ criou na sociedade. É muito comum escutar experiências ruins com a matemática de pessoas em relação a sua formação cidadã. Então penso que esse é um dos principais pontos. Pois podemos aprender a matemática e a estatística até mesmo brincando. Além disso, em relação ao pensamento crítico deles, acredito que essa abordagem possibilitou a enxergar que existem momentos em que a matemática estrutura situações e espaços, como até mesmo uma brincadeira. Muitos saíram das oficinas dizendo que podemos ver estatística em tudo”, comenta o pesquisador.
A dissertação não só reafirma o poder do brincar como ferramenta pedagógica, mas também oferece um modelo replicável para escolas que desejam inovar no ensino de matemática. Ao transformar a sala de aula em um espaço de diálogo e experimentação, a pesquisa demonstra que aprender pode ser, além de significativo, profundamente prazeroso.
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