Discursos coesos podem influenciar decisões políticas e econômicas

Dissertação analisa o posicionamento dos trabalhadores da classe financeira nas eleições presidenciais brasileiras de 2022

De acordo com Giovanna Macieira Rosário, a fase atual do capitalismo pode ser compreendida a partir da hegemonia do setor financeiro. Tal setor exerce uma influência efetiva na alocação de recursos e geração de lucros de vários segmentos econômicos. Nesse contexto, a pesquisadora do Instituto de Relações Internacionais (IRI-USP) produz a dissertação O posicionamento da classe financeira durante as eleições presidenciais brasileiras de 2022: um estudo sobre poder empresarial e coesão”, sob a orientação do professor Felipe Loureiro. “Eu vivenciei as eleições de dentro de um banco e como estava inserida nesse ambiente, veio a ideia do tema”, comenta Giovanna, que, recém formada, trabalhava em uma instituição financeira na época. 

A pesquisa busca compreender o posicionamento político da classe financeira durante as eleições presidenciais brasileiras de 2022 e reconhecer se há uma coesão ideológica entre os discursos de figuras pertencentes à essa classe. O estudo da coesão de discursos visa entender a influência dos detentores de grandes cargos de instituições econômicas privadas no debate público. As declarações foram analisadas a partir de cinco temáticas: liberalização do mercado de capitais; privatização de empresas públicas; políticas de austeridade fiscal via corte de gastos; políticas monetaristas de controle da inflação; e flexibilização de leis trabalhistas. 

Influência na mídia 

O estudo aponta que nas últimas décadas o pensamento econômico dominante se alinha aos interesses da classe financeira. “Foram as políticas econômicas que os atores financeiros patrocinam que alçaram essa classe a uma posição de hegemonia, o que garante que essas continuem a ser implementadas e aprofundadas.” A pesquisa mostra que nesse cenário os atores financeiros passam também a exercer uma função de comentarista da economia, reforçando uma ideia de que o que é bom para o mercado é bom para o país e para o mundo. Em períodos eleitorais, essa opinião é ainda mais requisitada pelos veículos hegemônicos de comunicação. 

Giovanna explica que o fato do grupo ser muito coeso em seus discursos já o posiciona como um ator de grande influência, justamente pela ausência de contestação entre o grupo. “São considerados conselheiros para falar da economia pública sendo que atuam em instituições privadas, como se isso os qualificasse para opinar sobre políticas públicas e econômicas do Estado”, afirma a pesquisadora, que conclui que esses fatores acarretam na ausência de pontos de vista distintos na mídia quando se trata de economia. “É preciso desmistificar o discurso da classe financeira como um discurso neutro e levar em consideração que eles são vinculados à uma instituição”, completa.

Lula x Bolsonaro 

Em relação às políticas econômicas avaliadas pela dissertação, os atores financeiros exibiram uma maior confiança em relação a Lula do que a Bolsonaro. Giovanna explica que o fato de serem analisados discursos de atores que ocupam posições muito altas na hierarquia do setor, juntamente com o fato de Lula ter liderado as pesquisas, contribuiu para um cenário mais favorável àqueles que eram simpatizantes do Lula se manifestarem. “ Bolsonaro desagradou muito essas pessoas por conta da política fiscal e no combate à pandemia. O Lula era visto como o mal menor e muito disso relacionado à gestão fiscal do Bolsonaro e à imprevisibilidade dele”, explica. Ela também comenta sobre uma lembrança positiva do primeiro mandato de Lula em relação à políticas econômicas juntamente com a escolha de Geraldo Alckmin como vice-presidente, o que pode ter ajudado na conquista  do setor financeiro.

Lula e Alckmin em cerimônia de Transmissão de Cargo do vice-presidente da República. [Foto: Reprodução/ Flickr]

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*