Pesquisas iniciais da USP buscam melhorar o tratamento e trazer mais visibilidade para a leishmaniose

Segundo pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas, atuais medicamentos são dolorosos e tóxicos para os pacientes, utilizando até metais pesados em sua composição

[Imagem de capa: Arquivo Pessoal/Julia Magalhães]

”A finalidade é sempre entender como é essa relação do patógeno, que causa a doença, e o hospedeiro, que abriga o parasita, pois entendendo a interação dos dois, achamos pontos que podemos usar para tratar a doença” Stephanie Maia Acuña

Através de várias pesquisas que analisam a infecção de macrófagos, as células do sistema imune na linha de frente do combate à leishmania (protozoário da leishmaniose), o Departamento de Imunologia do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) busca trazer mais visibilidade para a leishmaniose, que é uma das 20 doenças mais negligenciadas, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).

A pesquisa se encontra em fase inicial com o  objetivo final de fabricação de um possível medicamento que auxilie no tratamento. De acordo com Jonathan Miguel Zanatta, doutorando do ICB, “os testes são feitos em várias camadas até chegar no indivíduo final, que é o ser humano”. No estágio atual, os pesquisadores procuram entender como o macrófago interage com a leishmania e é controlado por ela, permitindo que o corpo desenvolva a leishmaniose. Passado da etapa, os próximos passos são realizar experimentos nas clínicas com animais, por exemplo, e fabricar os possíveis remédios. 

Jonathan Miguel Zanatta e Stephanie Maia Acuña, doutorandos e pesquisadores do ICB, no laboratório de neuroimunes. [Imagem: Arquivo Pessoal/ Julia Magalhães]
Segundo a doutoranda do ICB, Stephanie Maia Acuña, a transmissão da leishmaniose é peridomiciliar, ou seja, ocorre perto das residências humanas. O vetor da doença é um inseto, o mosquito-palha, que é encontrado em lugares úmidos, escuros e com muitas plantas, como as matas e florestas. Por isso, a enfermidade não é vista nas grandes cidades, mas, sim, nos arvoredos que cercam os municípios. Stephanie afirma que a leishmaniose costuma afetar a camada mais pobre da população que, muitas vezes, mora ou trabalha nas regiões de contágio, perto das florestas, e não nos centros urbanos. Mas a enfermidade ainda pode atingir pessoas das grandes cidades que vão para regiões mais rurais. 

Por ser uma doença associada à população mais pobre, a mudança no tratamento da leishmaniose não é de interesse das indústrias farmacêuticas, mesmo que a medicina tradicional utilize elementos tóxicos na composição dos remédios atuais. “Essas doenças negligenciadas são chamadas assim porque são alvo de estudos só das entidades governamentais, de financiamento público; o interesse das companhias privadas não existe, porque não gera lucro”, conta Stephanie. Mas existem perigos da leishmaniose não só para a população humana. 

Existe uma lei no Brasil que afirma que quando um animal doméstico é infectado por leishmaniose, é preciso realizar a eutanásia compulsória, ou seja, ele precisará ser sacrificado. De acordo com Jonathan, alguns lugares, procurando evitar a morte dos animais, estão tratando a doença com o uso de remédios humanos. No entanto, o perigo dessa prática está na resistência que o protozoário causador da leishmaniose pode adquirir. As toxinas do remédio não terão mais uma ativação completa na leishmania, já que ela recebeu essa dosagem quando estava no corpo do animal doméstico e adquiriu maior resistência. Assim, não será possível combatê-lo de maneira eficiente se ele infectar o ser humano. 

Os pesquisadores do ICB se especializaram na Leishmania amazonensis, que causa a leishmania tegumentar, afetando a pele do paciente [Imagem: Arquivo Pessoal/Julia Magalhães]
Um outro cuidado a ser adotado em relação à leishmaniose é a sua capacidade de permanecer adormecida no corpo do hospedeiro, mesmo depois do tratamento. A leishmania não infecta somente macrófagos, ela pode se estabelecer por várias partes do corpo, como na região dos olhos, que são órgãos imunoprivilegiados, ou seja, lugares que não pode haver grande inflamação, pois, caso tenha, existe o risco de perder a sua função primordial, nesse caso, a visão, e por isso, apresentam maior imunidade. Por ser uma doença que atinge diretamente células que fortalecem nosso sistema imune, para o protozoário da leishmaniose, os órgãos imunoprivilegiados são regiões nas quais ele pode “se esconder”, até que o paciente tenha uma baixa da imunidade e ele volte a se manifestar.

A mais perigosa é a Leishmania infantum, que é a causadora da leishmania visceral, responsável por atingir órgãos internos, como fígado e baço. Caso não haja tratamento da leishmaniose visceral, ela pode ocasionar a morte do paciente, e segundo o relatório da Organização Pan-Americana de Saúde, 96% dos casos de leishmaniose visceral da América Latina ocorrem no Brasil. Embora haja remédios para essa doença infecciosa, a falta de informação e a negligência das empresas farmacêuticas têm como consequência a morte de algumas pessoas.

Norte do país é a região com mais casos de Leishmaniose, cerca de 34,9% das ocorrências  [Imagem: Arquivo Pessoal/Julia Magalhães]

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