Programa “Ruas Abertas” é indicador de mudanças positivas nas políticas públicas de São Paulo

Pesquisadora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP identificou aspectos socioculturais benéficos no modelo atual de intervenção urbana

Paulista Aberta, aos domingos e feriados — Fotomontagem de Guilherme Castro com imagens de Mark Hillary e Carlos Varela/Flickr

O ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, promulgou em 29 de dezembro de 2016 a lei que instaurou o programa municipal Ruas Abertas, medida responsável por abrir temporariamente, aos domingos e feriados, vias para livre circulação de pedestres, ciclistas, atrações socioculturais e esportivas.

A implementação do programa não foi idealizada autonomamente pelo prefeito, mas, sim, resultado de proposições da sociedade civil e movimentos sociais, como Minha Sampa e SampaPé, que reivindicavam espaços de recreação, confraternização e lazer acessíveis. 

Uma das ruas contempladas pelo programa foi a Avenida Paulista, que se tornou gradualmente centro cultural e de socialização paulistana. Ela foi pioneira nos testes recentes relacionados à ocupação dos espaços públicos, principalmente por conta da campanha Paulista Aberta.

Segundo Camila Motoike Paim, pesquisadora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, essas propostas de intervenções urbanas, sobretudo iniciadas por movimentos sociais, não são recentes. Desde os anos 90, a população de São Paulo já demonstrava ser contrária à narrativa de que as ruas eram território exclusivo dos automóveis — as passeatas locais do Movimento Caras-Pintadas contra o ex-presidente Fernando Collor de Mello são exemplo disso.

Existe um histórico de políticas parecidas ao longo da cronologia do Estado, como a iniciativa “Ruas de Lazer”, criada durante a gestão de Olavo Setúbal. Por outro lado, essa medida, assim como muitas outras que seriam desenvolvidas, dependia inteiramente de sua lógica interna de funcionamento e da adesão do público, o que condicionou o seu insucesso. A Paulista Aberta se diferencia, nas palavras de Paim, porque as pessoas a usam livremente.

Corrida de saco na Rua de Lazer, abril de 1976 — Foto: Acervo Estadão/Reprodução da tese de Mestrado de Camila Motoike Paim
Camila Motoike Paim — Foto: Reprodução/LinkedIn

Alguns impeditivos para a execução do programa Paulista Aberta, de acordo com a pesquisadora, foram as lógicas de trânsito e serviços essenciais na região, como atendimento médico rápido. À época, por meio de entrevista aos principais hospitais do entorno, a revista Carta Capital esclareceu que nenhum estabelecimento se opôs ao funcionamento da medida, já que dispunham de acessos alternativos aos seus prontos-socorros, como as vias paralelas à Avenida Paulista. 

A maleabilidade do programa aparece como ponto fundamental da pesquisa, já que reforça a necessidade de planos de infraestrutura bem acabados, que levem em conta a necessidade e possibilidade de adaptação do ambiente e do público às mudanças socioespaciais. Nesse caso, o diálogo entre comunidade e governo foi essencial para o desempenho positivo da política pública.

Para além da análise teórica da iniciativa, Paim também utilizou de pesquisa de campo e observação direta para construir seu estudo. “O começo da pesquisa foi esse — pesquisa de campo. Ir lá, observar, tirar fotos, fazer algumas anotações. Então, a partir desse material, deu para perceber quais eram as principais atividades que aconteciam ali”, diz. 

Por meio dessa investigação, ela conseguiu identificar que a adesão do público à Paulista Aberta, ao contrário dos demais programas, deu-se por intermédio de uma relação orgânica entre os ocupantes do espaço, que criaram as dinâmicas que existem hoje por meio da convivência e trocas cotidianas. 

Paim também ressalta que, embora o programa não seja um modelo literal, ele age como um sistema de inspiração para outras políticas públicas, cuja participação popular é a chave.

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