Livro inédito de fotografias de Mário de Andrade é lançado

Obra reúne 25 fotos tiradas pelo escritor durante viagem ao Nordeste entre 1928 e 1929

Mário de Andrade produziu obras em diversas áreas da cultura — Foto: Acervo IEB-USP

O Instituto de Estudos Brasileiros da USP (IEB) lança hoje, dia 15, o livro Viagem ao Nordeste brasileiro 1928-1929 – Álbum de Fotografias de Mário de Andrade. A obra reúne 25 fotos tiradas e selecionadas por Mário de Andrade, além de legendas informativas e crônicas que o autor escreveu para O Turista Aprendiz, coluna no jornal Diário Nacional.

As imagens foram feitas durante uma viagem para o Nordeste entre 1928 e 1929. No percurso, 262 fotos foram capturadas pelo escritor. Mário de Andrade, porém, escolheu apenas 25 para compor um álbum, que, agora, tornou-se livro. 

O motivo por trás da composição do projeto é um mistério. Não há cartas ou documentos que digam o porquê as imagens foram selecionadas e separadas. “É uma peça que ficou apenas na intimidade do escritor, um álbum é feito para si próprio”, conta Luiz Bargmann, fotógrafo e documentarista responsável pela organização da obra.

A falta de declarações e divulgação sobre a coletânea foi o que chamou a atenção de Bargmann: “O fato do álbum ser um material pouquíssimo conhecido foi a grande motivação para tornar isso público e materializado no livro.”

No entanto, nem todas as fotos são inéditas. Segundo o documentarista, cinco delas foram publicadas por Mário em 1929. Já em maio de 1939, o retrato de Catolé do Rocha acompanhou um artigo que ele escreveu para o Jornal Estado de São Paulo.

Foto do convento em Catolé do Rocha, Paraíba, no dia 20 de janeiro de 1929, por Mário de Andrade. – Foto: Acervo IEB-USP

O álbum também chama a atenção, pois a experimentação empregada nas imagens era pouco comum no período. Na historiografia, o início do modernismo da fotografia no Brasil foi em 1940. “Não tinha pessoas que estavam explorando o modelo como uma expressão artística”, diz o organizador do livro.

Mário usava uma Kodak Vest Pocket, máquina para amadores que apelidou de “Codaque”. As capturas resultaram em ampliações de 11×16,5cm em filtros nas cores preto, branco e sépia, com legendas em grafite. “Ele tinha uma câmera simples, mas conseguiu bons resultados”, afirma Bargmann. “Algumas imagens têm problemas mais críticos e difíceis de resolver, afinal ele tinha começado a fotografar há dois anos.”

A primeira experiência de Mário com fotos foi em 1927, quando viajou ao Amazonas. Porém, o contato com essa expressão artística sempre existiu. O curador do livro conta que Mário recebia mensalmente revistas europeias com informações sobre fotografia. “Ele era uma pessoa muito curiosa e interessada nas coisas do seu tempo e retratos alimentavam essa curiosidade.”

Foto de Gaveta da Salina em Macau, Rio Grande do Norte em 18 de janeiro, 1929, por Mário de Andrade – Foto: Acervo IEB-USP

O escritor viajou para o Nordeste com objetivo de pesquisar a cultura musical das representações dramáticas da região. Passou por Pernambuco, Alagoas, Rio Grande do Norte e Paraíba. “Para viabilizar essa viagem financeiramente, escrevia crônicas e mandava para o jornal Diário Nacional”, explica o documentarista. Os textos faziam parte da coluna Turista Aprendiz. Trechos deles estão no livro, forma encontrada pelo organizador para contextualizar o momento em que as fotos foram tiradas.

Além das crônicas, Luiz Bargmann também colocou fotografias coadjuvantes – integrantes da seção Gaveta do livro – para acompanhar as 25 fotos principais. Elas foram tiradas no mesmo momento e cenário que as destacadas, mas não foram selecionadas por Mário durante a construção do álbum. O curador acredita que as fotos da Gaveta podem ajudar na compreensão do que o escritor vivenciou quando tirou as outras.

No álbum, duas em cada cinco fotos dão destaque à arquitetura. “Ele estava com um olhar pesquisador e, nesse sentido, a arquitetura chamou muito sua atenção”, explica o documentarista. As imagens também dão atenção às pessoas negras, captam a paisagem do Sertão e apresentam o drama da seca na Caatinga, algo inédito para Mário.

“Acho que algumas fotografias também se destacam pela qualidade criativa no enquadramento na composição da imagem”, acrescenta Bargmann. “Uma das que mais gosto é a foto do Cícero Dias. É um retrato muito expressivo do ponto de vista artístico.”

Imagens do livro dão destaque a arquitetura. Foto da igreja matriz de Sant’Ana e São Joaquim, em São José do Mipibu no Rio Grande do Norte no dia 7 de janeiro de 1929, por Mário de Andrade. – Foto: Acervo IEB-USP

A ideia de construir o livro surgiu a partir de conversas de Bargmann com Telê Ancona Lopez, curadora do Arquivo Mário de Andrade, do IEB. A especialista, o fotógrafo Cristiano Mascaro e o cineasta estudioso do modernismo brasileiro Carlos Augusto Calil participam da obra com textos analíticos sobre a coleção de fotografias. 

O projeto teve apoio financeiro do ProAC (Programa de Ação Cultural do Estado de São Paulo) e exemplares serão distribuídos gratuitamente a instituições, universidades, bibliotecas e centros culturais para livre acesso do público.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*