Os efeitos do trabalho na saúde

Artigo chama a atenção para as consequências nocivas que as atividade profissionais podem ter na vida dos trabalhadores

O trabalho dos entregadores passou a ser considerado essencial na pandemia e é um dos mais precarizados [Foto: Roberto Parizotti/FotosPublicas]

A pandemia colocou em evidência os chamados trabalhadores invisíveis. Sejam eles profissionais da linha de frente, como enfermeiros, ou entregadores de serviços de delivery, essas pessoas ganharam destaque por terem que continuar trabalhando apesar do aumento dos casos de coronavírus – e, assim, por não poderem preservar sua saúde por meio do distanciamento social.

É nesse contexto que surge o artigo Patogênese das novas morfologias do trabalho no capitalismo contemporâneo: conhecer para mudar, publicado na revista Estudos Avançados, volume 34, número 98. René Mendes, autor do artigo, destaca que nesse período, muitas atividades informais e socialmente pouco prestigiadas passaram a ser vistas como essenciais. Ele acredita que a pandemia evidenciou a desvalorização que algumas profissões sofrem diariamente, mostrando que “para que possamos trabalhar em casa e, até, viver, muitos precisam trabalhar para nós e por nós”.

O texto é um passo inicial para o início dos trabalhos do projeto de pesquisa coordenado por René: Impactos das Novas Morfologias do Trabalho Contemporâneo sobre o Viver, o Adoecer e o Morrer de Trabalhadores e Trabalhadoras, no Instituto de Estudos Avançados. Segundo o pesquisador, “uma das questões menos conhecidas e, talvez, mais importantes, tem a ver com a segurança e saúde no trabalho. Pela natureza informal ou frequentemente irregular e mesmo ilegal de certas condições de trabalho, estas informações podem ficar de fora dos registros oficiais – por exemplo, de acidentes do trabalho, de mortes por acidente do trabalho, e de doenças relacionadas com o trabalho. Conhece-se pouco ou insuficientemente tal problemática. Também na produção e na literatura científica.”

René acredita que, por mais que o coronavírus tenha trazido uma maior atenção da sociedade e do meio acadêmico à questão da saúde no trabalho, esse problema já ocorria de forma bastante recorrente antes da pandemia. Ele explica que essa é uma das grandes preocupações no projeto que está em desenvolvimento no IEA/USP, exatamente sobre os impactos das novas morfologias do trabalho contemporâneo sobre o viver, o adoecer e o morrer de trabalhadores e trabalhadoras.

O artigo expõe o conceito de trabalho determinado pelo IBGE, que abrange diferentes formas de produção (trabalho em ocupação, trabalho em casa, trabalho voluntário, entre outros). Além disso, explora as diferentes patologias que podem ser potencialmente causadas por situações adversas do trabalho. O texto sintetiza a tendência apontada por trabalhos já desenvolvidos sobre o assunto, dividindo as patologias em dois grupos: as patologias da sobrecarga e do desgaste – que abrangeria a fadiga física e mental e lesões por esforços repetitivos relacionados ao trabalho – e as patologias da solidão ou silêncio – transtornos mentais depressivos ou suicídio relacionado ao trabalho.

O crescimento exponencial do trabalho remoto neste período de pandemia, tem resultado em uma conexão constante das pessoas ao trabalho, podendo acarretar patologias de ambos os grupos citados. “Tal alternativa de trabalho, quando possível, tem argumentos favoráveis e tem sido ‘vendida’ como altamente vantajosa para os trabalhadores e trabalhadoras. Contudo, tanto antes da atual crise, quanto durante esta crise e após a crise, a violação abusiva do interior de nossos lares pelo trabalho é uma real ameaça. Não apenas pela invasão da vida pelo trabalho, como pela perda de controle do tempo dedicado ao trabalho”, comenta René.

Ainda sobre a pandemia, o pesquisador fala sobre a profunda desigualdade social brasileira, ainda mais evidenciada pela incidência da doença. “Diz-se que o vírus SARS-CoV-2 é democrático, ao atingir todas as classes sociais. Mas a exposição (comunitária e ocupacional), o contágio, o curso e gravidade da doença e letalidade da Covid-19 não o são! E essa é uma das maiores e mais tristes revelações desta pandemia no Brasil e em outros países socialmente desiguais e injustos”.

Por fim, René lembra que “a crise econômica e sanitária tem provocado a perda de postos de trabalho, de direitos trabalhistas, além do aumento abusivo da flexibilização e precarização do trabalho, explícita ou disfarçada. Tal como a superação do distanciamento e isolamento social no mundo pós pandemia, haverá, também, que ser reconquistado o direito à melhoria das condições de trabalho”.

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