Pigmento simples desafia determinação de cor de dinossauro

Ensaio de paleontólogos brasileiros mostra que coloração de pterossauro não pode ser comparada a de aves atuais

Fonte: Wikimedia Commons / Intervenção: Pedro Teixeira

Para estudar as cores dos animais, cientistas analisam penas e fios de cabelos, tecidos altamente queratinizados ricos em pigmentos orgânicos, como melanina, carotenos e porfirinas. Animais modernos, como um pavão, apresentam arranjos complexos nas estruturas responsáveis por sua cor — os melanossomos. Desde 2008, paleontólogos comparavam formato dessas organelas para inferir a cor dos dinossauros, os comparando com aves. Só que estudo publicado na revista Nature, na última segunda-feira (04), mostra que essa comparação está errada.

Na crista de um Tupandactylus Imperator se encontram melanossomos com formato quase esférico. As evidências vêm de um crânio fossilizado e muito conservado de um animal que viveu 110 milhões de anos atrás. Em um pássaro castanho, como um bacurau, a organela é redonda e contém um tipo de melanina mais sofisticado – a feomelanina. Já em um corvo preto, sua forma é mais comprida e o pigmento é a eumelanina, mais simples, e também presente em muitos répteis.

Os melanossomos do dinossauro são arredondados como os do bacurau, mas contém eumelanina, como no corvo. A presença do pigmento é apontada em três diferentes categorias de ensaio que fazem parte da tese de doutorado de Gustavo Prado, do Instituto de Geociências (IGc) da USP. O objeto é o fóssil descrito antes por Felipe Pinheiro da Unipampa, coorientador de Prado.

O doutorando do IGc conta que a intenção inicial dos testes era verificar se as estruturas arredondadas na crista do pterossauro eram mesmo melanossomos. Pinheiro as identificou como bactérias em uma publicação de 2013. Respostas ao artigo vieram de todo o mundo. Alguns concordaram, outros não. Por isso, as amostras foram ao Japão, à Inglaterra e ao acelerador de partículas Sirius em Campinas para nova leva de ensaios.

Além de encontrar melanina, foi possível identificá-la como eumelanina. A feomelanina se desgasta mais facilmente ao longo do tempo. Logo, o pigmento pode não ter sido apontado porque se decompôs. No entanto, a presença da molécula mais simples no melanossomo esférico basta para implicar a não correspondência, pois não existem aves com fisiologia assim.

Condições de preservação da crista do T. Imperator eram únicas, Fonte: Reprodução/ Scientific Reports

Foi a primeira vez que um mesmo material foi submetido a essa variedade de testes e os resultados também são inéditos. O crânio fossilizado encontrado na Chapada do Araripe, em Nova Olinda, Ceará, é o mais preservado já catalogado.

“Cor dos dinossauros ainda vai dar muita briga”, afirma doutorando

Prado explica que estudar a pigmentação dos dinossauros é uma ciência recente. Surgiu em 2008, com uma publicação de Jakob Vinther da Universidade Popular de Bristol. Assim, os paleontólogos têm um quadro em branco para pintar. Porém, precisam de fósseis bem preservados, tempo e fomento para suas pesquisas. Esses ensaios foram financiados pelo CNPq, mas o pesquisador conta que muitas vezes tira dinheiro do próprio bolso.

No trabalho publicado na Nature, os cientistas escolheram não arriscar dizer como os pigmentos do pterossauro se manifestavam como cor no animal. “Deixaria nossa pesquisa muito aberta”, esclarece o doutorando. Com análises estatísticas e muitos livros de fisiologia, pode ser possível encontrar novas respostas. Ele diz que explorará o assunto em próximos artigos.

Fora a cor, os pigmentos dão outras dicas sobre a vida desses animais. Sintetizar melanina, caroteno e porfirina gasta energia. Por outro lado, pode representar vantagens evolutivas; seja no rito reprodutivo, ou em propriedades antioxidantes. Essas proteínas apareceram pela primeira vez há cerca de 3 bilhões de anos, em organismos unicelulares, amenizando efeitos do sol sobre esses seres vivos, segundo Prado.

Entretanto, o pesquisador do IGc lembra que muitos pássaros têm mais de um tipo de pigmentação. “Quem garante que um pterossauro não era pintadinho como uma galinha da angola?”, questiona. Em vista disso, ele espera discussões no futuro. Talvez, com cuidado, os dinossauros do Jurassic Park terão cores fiéis aos originais.

Exposição Fósseis do Araripe no Museu do Instituto de Geociências – IGC. 2017/12/13 Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Prado continua seus estudos com o Tupandactylus Imperator do Instituto de Geociências. O fóssil completo do animal, o único do mundo, está exposto no museu da unidade.

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