Durante todo o curso de contabilidade, os graduandos enfrentam uma grade com 42% de disciplinas que exigem algum conceito matemático. Para muitos é uma surpresa desagradável, pois esperam uma porcentagem menor ou até mesmo não ter que lidar com a matéria após o vestibular.
A pesquisadora Denise Freitas Mendonça Godinho estava no primeiro ano da pós-graduação quando descobriu essa dificuldade por parte de seus colegas de classe. Determinada a entender a origem do problema, iniciou um estudo a fim de analisar o perfil matemático dos alunos de graduação em contabilidade pela FEA. “Será que existem pessoas que estão se achando no lugar errado? Até que ponto isso as estão impedindo de seguir na carreira?”.
Desde a década de 70, Sheila Tobias já falava sobre os desafios no aprendizado da matemática. Seus resultados apontaram para uma forte relação do incentivo conforme a cultura e o gênero. Segundo a pesquisadora, na população ocidental as meninas são mais desencorajadas a aprender os conceitos do que os meninos. “Isso fica claro quando analisamos a população oriental. Como as mulheres são responsáveis pelo orçamento da casa, elas são muito melhores em matemática do que os homens. Nessa realidade, são os meninos que são desincentivados”, explica Denise.
O ensino da matemática deve ser feito em fases. A cada nova etapa, o aluno deve aprender um novo conceito que o ajudará a realizar um cálculo mais complexo. O problema da aprendizagem está exatamente em como os educadores lidam com alunos que encontram entraves em alguma parte. “Se o aluno não é encorajado a aprender, a cada nova falha a aversão vai piorando. Em casos mais graves, ele pode desenvolver até mesmo a matemofobia, quando o medo causa sintomas físicos.”
Para sua pesquisa, Denise usou conceitos desenvolvidos pela educadora Marcela Brito, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A professora formulou um questionário com 20 afirmações, dividindo igualmente entre respostas positivas e negativas. Os alunos deveriam responder se concordavam completamente, concordavam, discordavam ou discordavam completamente. A falta de uma opção neutra era essencial para forçar um posicionamento do estudante. Os resultados definiam o nível de aversão ou afinidade dos alunos com a matemática.
Na época, Denise era monitora da disciplina de contabilidade introdutória no curso de administração da FEA. Desse modo, para fins de pesquisa, ela decidiu aplicar o formulário aos 105 alunos matriculados. Em conjunto desenvolveu um espectro, no qual analisava o desempenho do aluno no curso com as respostas do teste.
Em toda a classe foi possível identificar três tipos de padrões: alunos com afinidade e boas notas na disciplina, aversão e desempenho baixo na disciplina e estudantes que apesar da repulsa por matemática, tiveram um bom desempenho. “Consegui depoimentos muito interessantes dos estudantes que tinham aversão. Eles diziam ter medo, vergonha. Usaram emoções para contar como tinha sido aquele primeiro semestre. Eram emoções tão fortes que um deles tremia enquanto falava comigo”, conta a pesquisadora.
Denise se interessou muito pelos casos de aversão combinadas com um bom desempenho, todavia não conseguiu conversar com nenhum aluno. “Eram cinco casos. Tenho a impressão que era algo relacionado com a síndrome de impostor. Quando chamei pra conversar a pessoa recuou. Era como se eles pensassem que eu iria questionar a habilidade deles. Preferi analisar a falta de resposta do que forçar.”
A pesquisadora acredita que o primeiro passo é reconhecer o problema: “É necessário admitir a presença desses alunos em sala de aula. Na hora de lecionar, os professores precisam ter consciência de que eles estão ali e que precisamos fazer algo a mais se quisermos recuperá-los”. Assim como em outras faculdades, Denise espera que a FEA incentive a criação de novos grupos de estudo.
A individualidade pode ser o principal canal. Com a ajuda da Faculdade de Educação da USP, a pesquisadora quer desenvolver um novo estudo sobre maneiras mais efetivas de se ensinar a matéria. “Precisamos trabalhar formas de explicar o mesmo conceito de um jeito que o aluno não tenha trava e estar treinados para identificar fobias. O objetivo é buscar soluções alternativas para deixar esse aluno mais confortável.”
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