Saldão de Estatais: o que esperar do plano de privatizações

Professor da FEA comenta sobre opiniões contrárias e favoráveis ao pacote de privatização brasileiro

Arte por Gabrielle Torquato

Uma das promessas mantidas pelo Presidente Jair Bolsonaro tem sido a privatização de estatais. Em agosto deste ano, após uma reunião com o conselho do Programa de Parcerias de Investimentos, Bolsonaro anunciou o plano de privatizar nove empresas, dentre elas a Telebras e os Correios. 

Há anos esse assunto vem sendo discutido no Brasil e gera debate sempre que algum presidente inicia seus projetos de privatização. O professor Paulo Feldmann, docente da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA), especialista no assunto, comentou as opiniões contrárias e favoráveis à privatização brasileira.

Brasil acima de tudo, privatização acima de todos

No momento, o governo federal tem 130 estatais. Se somarmos as empresas pertencentes a estados e municípios esse número pode chegar até 400, segundo dados levantados pelo Observatório das Estatais, da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Pode parecer muito, mas essa quantidade já foi até maior na década de 1990. Durante esse período, o Brasil privatizou 119 empresas e arrecadou US$ 70,3 bilhões, entrando para lista de maiores privatizadores do mundo, ao lado do México e Reino Unido. 

Após um período sem muitas mudanças, o governo Temer voltou a colocar o assunto em discussão. Desde então, vem se estudando formas de realizar um verdadeiro saldão de estatais. Aeroportos, empresas de energia, portos e até mesmo a casa da moeda. A expectativa era de arrecadar R$ 44 bilhões para os cofres públicos e trazer algum fôlego para o caixa da União. 

Contudo, para além do capital acumulado, a privatização também pode ser solução para aquecer o mercado e aumentar a eficiência. Um exemplo muito conhecido é o caso da Telebrás, única no setor até ser vendida em 1998 e fragmentada em quatro grandes empresas. Além da arrecadação de R$ 22 bilhões para a União, a venda também aprimorou o serviço e contribuiu para o crescimento do acesso da população, democratizando os serviços de telefonia. 

Outro ponto levantado pelo governo é o fim da lavagem de dinheiro através de estatais. Após diversos escândalos, principalmente envolvendo a Petrobrás, a privatização traria o fim da indicação de cargos de confiança por políticos e afastaria a empresa da corrupção. 

Todavia, para Feldmann, apenas a extinção do cargo de confiança seria suficiente para melhorar a gestão das estatais. “O Brasil administra muito mal suas empresas. Os políticos indicam os cargos mais importantes e nem sempre são pessoas gabaritadas para assumir a função”, explica. 

(Arte por Gabrielle Torquato)

Nadando contra a corrente

Apesar dos planos brasileiros, a tendência mundial parece estar indo ao lado contrário. Segundo dados do Transnational Institute (TNI), centro de estudos em democracia e sustentabilidade, mais de 800 empresas se reestatizaram desde os anos 2000. Um dos aspectos influenciadores desse processo, segundo o TNI, tem sido justamente a precariedade e altos custos dos serviços pós-privatização.

Para o especialista, este é um ponto que deveria ter mais atenção do governo. É difícil mensurar se a escolha do novo proprietário trará os benefícios esperados, como por exemplo, a qualidade do serviço oferecido. 

As empresas estatais são reconhecidas por não prezar pelo lucro. O único objetivo na rede pública é realizar o serviço de forma eficaz e cobrar apenas o necessário para se manter autossuficiente. “Elas [estatais] podem trazer uma grande vantagem. Trabalham para o bem da sociedade e do País”, afirma Feldmann.

“Precisamos tirar da cabeça dos brasileiros que o público é ruim”, comenta o professor. As empresas estatais, tal como os Correios, oferecem um serviço que nem toda empresa privada ofereceria com qualidade sem visar os lucros. Apesar de deficitário, os Correios alcançam grande parte do território nacional por um preço acessível. 

A solução para a ineficiência atual das estatais pode estar em uma administração pública e moderna. “Uma gestão que acabe com a interferência dos políticos e que aumente o incentivo do funcionário em realizar o serviço, como a divisão de lucro, por exemplo”, finaliza Feldmann.

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