Grupo de depressivos têm dificuldade ao reconhecer expressões faciais

Em relação a adultos saudáveis, pessoas com depressão grave e que viveram estresse precoce são menos competentes na identificação de emoções

Representação gráfica das emoções. Retirado de: https://pixabay.com/pt/photos/emo%C3%A7%C3%B5es-sentimento-felicidade-ira-2713109/

Parte das pessoas com depressão grave (com sintomas psicóticos) têm maior dificuldade em reconhecer as emoções básicas por meio de expressões faciais. Isso foi revelado pela tese de doutorado do psicólogo Vinícius Ferreira Borges que também avaliou a habilidade de pessoas saudáveis expostas precocemente ao estresse em fazer o mesmo. Esse fator podia estar associado ou não à depressão psicótica. Era quando se combinava ao transtorno que a dificuldade era maior. Em contrapartida, quando em pacientes adultos saudáveis, aqueles que viveram estresse precoce tiveram maior nível de acerto, mesmo em relação aos saudáveis. 

Para encontrar esses resultados, Vinícius comparou quatro grupos de pessoas, estando eles em uma das duas chaves mais amplas, a de pacientes de depressão e a de indivíduos saudáveis.  Em ambos os casos, o fator da experiência do estresse precoce subdividia os grupos. O número total de participantes foi de 98, emparelhados entre si de acordo com o sexo e histórico (ou não) de estresse precoce. O estudo faz parte de um projeto temático (Stream) que integra um consórcio internacional (Eu-gei) centrado em investigar a esquizofrenia e outros transtornos psicóticos. A pesquisa foi realizada em Ribeirão Preto, sob a orientação da Professora Cristina Marta Del-Ben.

Sobre a caracterização do quadro clínico dos participantes do estudo, Vinícius afirma que “todos os participantes passaram por uma bateria de avaliações, incluindo uma entrevista diagnóstica padronizada e a aplicação de escalas e questionários sobre a gravidade de sintomas psiquiátricos, funcionamento global, história de estresse precoce, entre outros.”

O transtorno depressivo maior, ou simplesmente depressão, é um tipo de distúrbio mental muito comum, que, hoje, é considerado a principal causa de incapacidade em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No tipo de depressão abordada pelo pesquisador, a pessoa apresenta humor deprimido combinado com sintomas psicóticos, geralmente alucinações e delírios “niilistas, relacionados à crença de que coisas ruins podem acontecer”, nas palavras de Vinícius. 

Muitas evidências científicas sinalizam que o desenvolvimento da depressão e de outros transtornos psiquiátricos estão associados à vivência de estresse precoce. Esse fator pode ser definido pela vivência de qualquer tipo de abuso, maus-tratos ou negligência sofrido na infância e no início da adolescência. 

Reconhecimento facial e sua importância

Sobre o método que avalia a capacidade de reconhecimento facial das emoções, o psicólogo diz que os participantes foram submetidos a uma tarefa de identificação de expressões. O teste, chamado Degraded Facial Affect Recognition Task (DFAR), é composto por fotos desfocadas de faces de neutralidade, alegria, medo e raiva, às quais rótulos emocionais correspondentes devem ser atribuídos. Cada emoção dita básicas, primárias ou fundamentais possui uma expressão facial específica, que a distingue das demais. 

Vinícius fala da capacidade de perceber e interpretar corretamente essas expressões faciais como algo fundamental para o funcionamento social e as relações interpessoais. Diz: ”Reconhecer uma emoção de raiva na face de outra pessoa é uma pista importante para evitar situações de briga ou conflito. Ao contrário, o reconhecimento da alegria pode sinalizar que não há problemas”. E continua, “o reconhecimento de faces de medo, por sua vez, pode indicar que determinada pessoa possa estar enxergando uma ameaça, ainda não identificada por você. Esses exemplos, mostram como o reconhecimento de expressões faciais da emoção está ligado a situações de sobrevivência ou adequação social.”

Em relação aos pacientes saudáveis, aqueles com depressão psicótica associada ao estresse precoce tiveram pior desempenho na tarefa de reconhecimento. A expressão facial que correspondia à alegria foi muito confundida por esses pacientes com a demonstração de raiva. O também mestre em análise do comportamento afirma que “isso pode estar ligado à uma ‘visão de mundo’ mais hostil por parte dos depressivos psicóticos.”

Por outro lado, os participantes ditos resilientes — ou seja, aqueles que não desenvolveram depressão na vida adulta, ainda que tenham passado por esse tipo de estresse nas primeiras fases do desenvolvimento — apresentaram outro resultado. Para esses, quanto maior a gravidade do estresse sofrido, maior a taxa de acertos da expressão de alegria, mesmo em relação aos saudáveis que não passaram por essa dificuldade precocemente. Ocorreu o inverso do caso dos depressivos, para os quais essa maior gravidade se relacionava a um pior nível de detecção da alegria. 

O psicólogo explica: “De modo geral, esses resultados apoiam a ideia de que as pessoas mais resilientes, ou seja, aqueles que ‘envergam, mas não quebram’, que passam por dificuldades mas se recuperam tendem a reconhecer melhor as faces de alegria”. Ele complementa dizendo que é muito plausível que essas pessoas tenham a percepção mais aguçada das faces de alegria, porque, do ponto de vista evolutivo, essas expressões podem sinalizar situações de baixa ameaça ou relativa tranquilidade, de forma que saber reconhecê-las favorece a sobrevivência.

Média de acertos no reconhecimento facial da expressão da alegria. Fonte: Vinícius Ferreira Borges/ Tese de doutorado

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