USP e Prefeitura lançam publicação sobre imigrantes na capital paulista

Livro traz resultados acerca do acesso dessa população aos serviços públicos e políticas direcionadas a esse setor

Evento de lançamento do sumário executivo do projeto São Paulo Cosmópolis reuniu representantes do IRI e da Prefeitura de São Paulo. Foto: Vitor Garcia de Oliveira

Com o objetivo de auxiliar a Prefeitura de São Paulo a elaborar uma política para migrantes, o Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI/USP) e a Coordenação de Políticas para Migrantes (CPMig) da capital paulista firmaram um acordo em dezembro de 2013, cujo resultado será publicado em outubro na forma de um livro. Como primeiro fruto desse trabalho, um sumário executivo do relatório do projeto São Paulo Cosmópolis: os desafios de uma política migratória municipal foi lançado no último dia 20 de setembro, durante a 22ª Semana de Arte e Cultura da USP.

O livro vem em um bom momento já que o Brasil recebe um fluxo de imigrantes cada vez maior todos os anos. Só na cidade de São Paulo, por exemplo, a Polícia Federal estima que há cerca de 385 mil imigrantes regulares, com base em dados de junho de 2016. Esse número representa 32% do total de imigrantes em situação regular no Brasil.

Nesse cenário, os governos locais têm um papel fundamental a desempenhar na recepção dessa população. A professora Deisy Ventura, uma das coordenadoras do projeto, expõe que “o livro conta o que acontece nos primeiros anos em que São Paulo constrói sua política e demonstra, uma vez adotada essa, qual é a situação das informações disponíveis sobre o acesso a serviços nos diferentes órgãos públicos”.

Logo, as informações obtidas com o convênio podem contribuir para imigrantes, gestores e pesquisadores envolvidos na implementação da política local para essa população. “Não será possível se publicar algo sobre migração na cidade de São Paulo sem ter esse livro como referência. É uma obra que organiza dados, fixa conceitos, é ciência e à serviço do interesse público”, defende Pedro Dallari, diretor do IRI e autor do prefácio do livro.

A publicação divide-se em duas principais partes baseadas nos quatro anos de pesquisa. A primeira delas parte de entrevistas com agentes públicos municipais que mantêm contato com imigrantes na prestação de atendimentos ou serviços, buscando traçar um diagnóstico dos principais problemas relacionados ao atendimento de imigrantes nos serviços públicos municipais. Já a segunda parte do livro apresenta os dados sobre a população migrante, obtidos a partir de dados de diversos órgãos municipais e federais, a fim de se mostrar o nível de acesso dessa população aos serviços.

Para Ebenézer Oliveira, coordenador de Políticas para Imigrantes da Prefeitura, “é muito importante para o poder público a construção de parcerias de cooperação com a Universidade, a fim de subsidiar as políticas públicas. Nós que estamos dentro da política pública carecemos de conhecimento qualificado sobre as políticas em geral, já que muitas vezes há o conhecimento prático, mas não o conhecimento mais teórico.”

O lançamento do livro ocorrerá no dia 17 de outubro, às 15h, e contará com a presença de representantes da Organização Internacional para as Migrações (OIM), do Instituto de Políticas Públicas de Direitos Humanos do Mercosul, do IRI e da Prefeitura de São Paulo. Após lançado, o livro eletrônico ficará disponível para livre acesso no site do IRI.

Delegação de governos locais da rede de Mercocidades, composta por argentinos, brasileiros, chilenos,  peruanos e uruguaios, visita o Centro de Referência e Atendimento para Imigrantes (CRAI-SP). Foto: Divulgação/PMSP

O processo de pesquisa

Com o objetivo de traçar um panorama sobre as políticas direcionadas aos imigrantes na cidade de São Paulo e o acesso aos serviços públicos por parte dessa população, o projeto “São Paulo Cosmópolis” foi desenvolvido em duas etapas.

A primeira aproximação ocorreu através da realização de um diagnóstico, que levou dois anos e produziu informações essenciais para a construção da etapa seguinte da pesquisa. “A principal conclusão dessa etapa foi a constatação de que havia um déficit de informações e dados dos próprios órgãos municipais sobre o atendimento a migrantes”, afirma James Martins, mestrando do IRI e participante do projeto. Além disso, constatou-se uma ausência de coordenação entre os órgãos públicos quanto a coleta de dados.

O segundo momento da pesquisa representou uma resposta a essas questões. Para isso, foram realizadas entrevistas com agentes das públicos que lidavam diretamente com as bases de dados dos órgãos. Tal etapa não se limitou, no entanto, à cidade de São Paulo, abrangendo também o Departamento da Polícia Federal e do Comitê Nacional para Refugiados (Conare). “Entre as observações preliminares observamos que havia pouca sistematização das informações sobre os imigrantes, que as bases não estão sincronizadas entre si e que havia discrepâncias em relação ao número de imigrantes, inclusive devido à maneira com a qual os dados são coletados por cada secretaria”, explica James.

A partir disso, uma série de informações e análises foram sendo construídas, abrangendo as mais diversas áreas, como habitação, educação, saúde, emprego e assistência social. Esses resultados podem ter impactos sobre a melhoria na prestação dos serviços públicos e, consequentemente, na efetivação de direito dos imigrantes. “É muito provável que daqui de São Paulo saia a referência de qualquer tipo de política mais focalizada para os novos imigrantes do Brasil”, defendeu o professor Feliciano Guimarães, também membro da coordenação do projeto.

Na ocasião, Pedro Dallari lembrou que a divulgação e aproveitamento dos resultados do projeto contribuiu no processo que culminou na edição da lei do município de SP nº 16.478, de 8 de julho de 2016, que instituiu a política municipal para a população imigrante.

“A publicação desse livro é apenas um ponta-pé inicial e contamos com a continuação do trabalho de coleta de dados, essencial para o processo de construção das próprias políticas públicas para esse coletivo, que por não ter representantes políticos diretos precisam tanto dessa preocupação do poder público”, expôs James Martins

São Paulo Cosmópolis

O projeto São Paulo Cosmópolis: os desafios de uma política migratória municipal foi lançado através de um convênio firmado entre a USP e a Prefeitura Municipal, em 8 de dezembro de 2013, tendo como unidades executoras o IRI e a CPMig, da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo (SMDHC). No âmbito da USP, esta cooperação tomou a forma do Projeto de Extensão Universitária São Paulo Cosmópolis, originado a partir de outro projeto desenvolvido no Instituto, o Educar para o Mundo, iniciado em 2009.

De acordo com Deisy Ventura, quando se firmou o acordo “não era claro para o Brasil que o município deveria ter uma política pública específica para migrantes. Essa ideia foi construída ao longo dos últimos anos e acompanhou uma tendência internacional”. Ela destaca ainda que logo após o acordo, o tema principal do relatório da OIM naquele ano foi a cidade como elemento crucial na questão migratória, por ser um elemento de proximidade. “Ou seja, a OIM reconheceu e começou a dizer que as ações com os migrantes acontecem nas cidades. A tangibilidade ocorre no nível do governo local”, completa Deisy.

No lançamento do sumário executivo, também foram debatidos os benefícios proporcionados ao próprio campo acadêmico. “Espero que essas informações tenham também bastante repercussão no meio acadêmico, como um exemplo de união entre a tríade ensino, pesquisa e extensão da universidade pública”, relatou Isadora Steffens, pesquisadora do IRI.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*