USP analisa as taxas de fecundidade entre meninas de 10 a 14 anos durante a última década

Estudo analisou dados do Sinasc (Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos) e do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas)

Tabela demonstra a como a taxa de fertilidade em cada estado do Brasil se comportou em 2000 e 2012. Créditos: BMC Pregnancy and Childbirth

Amanda Panteri – amanda.panteri@gmail.com

As taxas de fecundidade entre adolescentes muito jovens (10 a 14 anos) permaneceram estáveis de 2000 a 2012 na maioria dos estados brasileiros, com exceção de três deles: Mato Grosso, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, assim como o Distrito Federal. A descoberta vai na contramão da diminuição significativa de nascimentos dentro do grupo etário de 15 a 19 anos, e levanta questionamentos a respeito. Ana Luiza Vilela Borges, docente da Escola de Enfermagem da USP (EE) e coordenadora do Nepesc (Núcleo de Estudos Epidemiológicos na Perspectiva da Enfermagem em Saúde Coletiva), é a responsável pela pesquisa, que já rendeu um artigo publicado na revista britânica BMC Pregnancy and Childbirth em 2016.

Durante os últimos 12 anos, o país passou por mudanças importantes com relação à prestação de serviços públicos de atenção básica. A melhoria nas condições de vida, o aumento da perspectiva profissional e educacional para as mulheres e o acesso a métodos contraceptivos contribuíram, de certo modo, para a diminuição da ocorrência da gravidez na adolescência, segundo apontam dados do Sinasc e do IBGE. Contudo, ao fazer um recorte com meninas mais novas (10 a 14 anos), Ana Vilela constatou que o mesmo não ocorreu, e as taxas de fecundidade não sofreram grandes alterações.

A descoberta é no mínimo curiosa, uma vez que os grupos são parecidos. “A gente entende que o que determinou a queda da taxa em um grupo não teve a menor influência no outro. Então seriam outros aspectos, que a gente precisa estudar, que estão fazendo com que isso não caia entre as outras adolescentes”, afirma a professora.

Uma das causas pode estar ligada à vulnerabilidade da faixa etária. Casos de coerção sexual, prostituição e abuso infantil ainda são recorrentes em diversos municípios. “A gravidez entre as adolescentes muito jovens está, muitas vezes, vinculada à violência”, conta. Além disso, o pequeno número de estudos a respeito dificulta uma análise mais profunda: “Existe muita atuação para o grupo infantil, e o grosso das pesquisas são voltadas para as adolescentes de 15 a 19 anos. Isso deixa, então, o outro grupo esquecido”.

Recorte espacial

A questão espacial também foi levada em consideração por Ana durante a coleta de dados. As taxas, no geral, podem estar relacionadas aos indicadores socioeconômicos do país, como o IDH, e eram maiores nas regiões Norte e Nordeste e menores no Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Em uma esfera maior, quando comparado a países que proporcionam melhores condições de atendimento primário, maior inserção da mulher no mercado de trabalho e até menores restrições legais ao aborto, o Brasil chega a atingir um número de meninas que se tornam mães muito jovens até 300% mais alto.

Taxas por região. Créditos: BMC Pregnancy and Childbirth

O Sinasc, um dos sistemas utilizados para a obtenção dos dados, melhorou muito desde 2000. A expansão de sua cobertura pode ter influenciado os resultados, como a professora ressalta: “Em um primeiro momento, esse aumento, na verdade, pode ter sido apenas uma melhora na captação e na qualidade da cobertura dos dados”.

Contudo, essas especulações ainda necessitam de exames mais aprofundados, uma vez que se trata de uma faixa etária com pouca literatura a respeito. Tendo isso em vista, Ana Vilela está contribuindo para a implementação do Global Early Adolescent Study (GEAS), estudo internacional focado em entender “como se dão as relações sociais desses adolescentes muito jovens entre seus pares e na família, como elas vão definindo seus comportamentos de gênero e o que isso pode repercutir na sua vida futura e no seu desenvolvimento ainda como adolescente”. Ele já possui contribuições de 15 países, e o Brasil será o 16º.

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