Pesquisa propõe meio sustentável de sintetizar insumos de medicamentos

Pesquisadores conseguiram sintetizar compostos úteis para fabricação de medicamentos utilizando apenas fontes renováveis e não poluentes

Imagem: Pixabay.com

É provável que pouca gente pare para pensar na quantidade de resíduos descartados e no gasto de energia e água que estão presentes na cadeia de produção de um medicamento. Por isso, pensar sobre a obtenção de substâncias bases (os chamados “insumos”, na indústria química) dos medicamentos de forma mais ecologicamente correta pode ser uma alternativa inovadora e uma opção de investimento em tecnologia.

É isso que fez em um de seus trabalhos o grupo de pesquisas do professor Leandro Andrade do Laboratório de Química Fina e Biocatálise, do Instituto de Química (IQ) da USP. Professor do IQ-USP e orientador dos mais variados projetos, ele e as alunas de seu grupo, Milene Hornink e Alice Lopes desenvolveram uma pesquisa acerca de uma metodologia sustentável para obtenção de determinada substância que pode ser usada para fabricação de remédios, as espiroimidas. Esse trabalho, que foi destaque na revista científica internacional Synthesis, nasceu de uma questão central no grupo: como sintetizar moléculas ou substâncias a partir da própria natureza sem prejudicá-la. “Além de estudar algo, estudamos como esse algo pode ser obtido a partir de uma fonte renovável, para tentar mudar as fontes derivadas de petróleo”, esclarece Milene, também doutoranda do IQ-USP. “O que nós [do grupo de pesquisa do Laboratório] temos feito é buscar formas de se obter produtos de interesse direto na nossa sociedade. Como a maior parte desses produtos importantes é originado de insumos de origem orgânica, desenvolvemos abordagens de construção molecular sustentável”, explica o professor Leandro. “É onde nosso Laboratório tem se dedicado mais, em fazer essa construção. No primeiro momento, identificamos um alvo molecular ⎼ um produto ou um composto químico que tem relevância para a sociedade, para então analisar as formas de produção ou de construção”. O grupo das espiroimidas possui o que os pesquisadores chamam de “atividades biológicas”, que incluem anti-convulsivantes, anti-arrítmico, anti-hiperglicêmico, sedativos e mais outras atividades relevantes.

Resultados

A ideia central de sintetizar as espiroimidas de maneira limpa, abrangendo os conceitos de química verde e sustentabilidade, vai desde o ponto de partida, que é a matéria prima, até a síntese do produto final. “Vimos que tínhamos [no Laboratório] um material de partida puramente obtido de fonte renovável, o ácido itacônico, obtido a partir da fermentação de xarope de milho por um fungo. Não precisa de nada derivado do petróleo”, conta Milene. Os dois também explicam que, na produção, os métodos como o fluxo contínuo e o uso de catalisadores naturais foram pensados para poupar energia e recursos ⎼ “nessa metodologia, precisamos de um catalisador, uma substância que acelera a reação. A gente utiliza um catalisador de ferro de baixo custo, em pouca quantidade. O fluxo contínuo [método para realizar as reações entre os componentes] também é uma forma de poupar energia e acelerar o processo”. Ao final da pesquisa, foram encontrados 21 compostos. Milene, porém, esclarece que “o laboratório não foca em sintetizar um composto fármaco específico, e sim, uma classe de compostos, como a das espiroimidas, uma classe útil para tratar determinados problemas. Não é sobre desenvolver um medicamento, mas um princípio ativo ou uma base para estes”. Ela conta que um próximo passo desejado é testar uma espiroimida cujo princípio ativo pode ajudar no tratamento do câncer.

Um modelo completo

Não apenas para o meio ambiente e para quem vai à farmácia é interessante que se promova esses meios para produção sustentável. Leandro explica que, além da dependência dos derivados do petróleo, a indústria química também é ainda muito dependente do exterior. “A gente precisa considerar não só a necessidade de se ter um país que seja sustentável na produção de seus próprios insumos químicos, mas, também, que ele possa não ser completamente dependente de indústrias internacionais. Não excluir toda a dependência dos nossos parceiros comerciais, mas sim incentivar a indústria nacional e entregar um produto com tecnologia nacional, em especial, uma tecnologia mais sustentável do que a atual”, comenta o professor. Assim, pode-se visar também esse aumento da demanda de empregos nas mais diversas áreas, inclusive na de pesquisador.

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