Tese de doutorado da Escola Politécnica propõe uma análise acerca de um consumo mais ecoeficiente nas lavagens de roupa

A análise de ecoeficiência compara diferentes métodos de lavagem de vestuário e os impactos financeiros e ambientais que podem propulsionar crises hídricas e, consecutivamente, crises energéticas no país

A análise de lavagem ecoeficiente analisa a retirada e o retorno dos recursos à natureza [Imagem: Reprodução/Freepick]

Através da análise do ciclo de vida, Renata Trovão, recém-doutora pela Escola Politécnica (Poli) da USP e professora da Universidade 9 de Julho, realizou uma avaliação ambiental para verificar o funcionamento da lavagem de vestuário, bem como os produtos inseridos no processo. Sua tese de doutorado, intitulada “Análise de ecoeficiência de diferentes alternativas de lavagem de roupas: uma contribuição para o consumo sustentável”, avaliou os recursos utilizados na atividade desde o momento em que são retirados da natureza como recurso natural até o momento em que retornam para a natureza como disposição final, sejam despejados em aterros e rios ou que sejam incinerados.  

Tendo entrado para o doutorado na Poli, Renata, que é química de formação, começou a tese baseada na linha de pesquisa voltada a áreas contaminadas por percloroetileno, um composto usado em lavanderias para lavagem a seco, entre outras coisas. Sua utilização pode causar sérias consequências a quem o manipula e, em decorrência disso, outros países já o baniram por meio de leis; no entanto, segundo Renata, o Brasil ainda o usa com muita frequência. Com o aprofundamento do estudo e com a escassez de contatos que se disponibilizassem para falar sobre o percloroetileno, a professora direcionou o conhecimento adquirido até então à análise e avaliação de ciclo de vida de lavagem de roupa em lavanderias. “Além disso, devido à pandemia de covid-19, não consegui ir em lavanderias e acabei mudando meu projeto para lavanderia residencial e como a praticamos em casa”, contextualiza.

Renata encontrou uma saída e um gancho para a continuação do estudo, pois com o distanciamento social, estabelecimentos temporariamente fechados e com a população passando mais tempo em casa, a atividade de lavagem tinha motivos para se tornar ainda mais rotineira nas residências comuns. “Sendo uma atividade que todos fazem diariamente ou semanalmente (dependendo da família), é raro que a maioria das pessoas pense na situação ambiental, se isso é ruim ou não e se está fazendo o certo. A atividade se torna automática e o ‘sempre fiz assim’ pode normalizar o consumo excessivo de água, energia e etc”, afirma a professora. “Sabendo da crise hídrica que estamos vivendo, que está culminando em uma crise energética, as pessoas têm demonstrado uma tendência a querer colaborar e melhorar as próprias ações, a fim de causar menos impactos ambientais”, complementa.

Ainda assim, a pesquisadora conta que é difícil orientar as pessoas em relação aos produtos que devem utilizar, de que forma e com qual quantidade de água e de amaciante, pois as melhores alternativas tendem a custar mais ao consumidor. É aí que a análise de ecoeficiência entra: unindo o eixo ambiental com o eixo econômico, que geram um gráfico, o cruzamento das duas informações revela a melhor forma possível, de acordo com os padrões ambientalmente mais corretos e com alternativas economicamente mais viáveis. “Isso é uma área de ascensão no mundo todo, porque todo mundo sabe que precisa cuidar do meio-ambiente, mas ninguém quer um desgaste econômico, então a ecoeficiência acaba abarcando esse viés”. 

A fim de trazer resultados quanto à melhor e pior situação encontradas, Renata realizou 16 ensaios oficiais, a fim de analisar diversos retornos ambientais e financeiros. Utilizando uma máquina modelo Brastemp de 11kg, os 16 ensaios descritos foram feitos com bases na distribuição dos dois tipos de agitação (normal e turbo), entre os quatro níveis de água (extra-baixo, baixo, médio e alto), e os dois tipos de detergente (líquido e em pó), totalizando oito ensaios para cada um dos detergentes. “Fiz os ensaios me apoiando nos manuais originais da máquina de lavar e dos produtos, mas pesei a roupa antes de colocar a água e os produtos, para saber a massa de roupa que estava utilizando em cada lavagem”, descreve. A professora conta que seguiu as orientações dos fabricantes de detergente e amaciante quanto à quantidade depositada em todos os casos. 

Os resultados

A finalização do estudo trouxe possíveis soluções para a questão ambiental-econômica da lavagem de vestuário em residências: o melhor é que a utilização da máquina seja efetuada com o máximo de roupa possível, dentro das especificações técnicas, e a quantidade de detergente e amaciante indicada pelo fabricante. Renata atesta que não há necessidade de fazer dois enxágues nas roupas. “Se você colocar a quantidade certa de detergente e amaciante, a segunda água, que já vem com o amaciante, já é suficiente para tirar o detergente corretamente”. 

O mais comum, segundo a professora, é que as pessoas coloquem mais detergente, pensando que o indicado não trará o efeito de limpeza ideal. “O típico ‘pouco detergente não faz espuma’ é um pensamento errôneo entre os brasileiros, que mantêm o hábito de achar que o funcionamento do produto está na produção de espuma”. Na verdade, a espuma só dificulta e prejudica ainda mais a retirada do produto, podendo desgastar ainda mais o tecido.

Além disso, a tese contextualiza que quanto maior o nível de água com menos roupa inserida, pior é o rendimento energético. Utilizando um software de cálculo com base nas análises de demanda de energia primária, análise de potencial de aquecimento global e de consumo de água (que são as três categorias de impacto ambiental observadas na avaliação do ciclo de vida), percebe-se que os gráficos emitidos mostram perfeitamente o aumento do impacto ambiental de acordo com o nível de água da máquina. 

Quando o nível de água é mais baixo, o impacto ambiental é menor, mas a professora propõe uma discrepância no gasto se o consumidor visualizá-lo de forma linear. “Suponhamos que tendo de lavar 11kg de roupa numa máquina de mesma capacidade, eu a encho totalmente e coloco os ingredientes. Suponhamos novamente que meu impacto seja de 100 pontos, o que é muito”, contextualiza. Dando continuidade ao raciocínio a partir de uma nova suposição, se a utilização da máquina se der com ¼ da roupa e com nível de água mais baixo, o impacto aferirá aproximadamente 30 pontos, que à priori parece ser menos impactante ambientalmente, mas a professora acrescenta mais um ponto: “Pense que para conseguir lavar a mesma quantidade de roupa, você vai ter uma descrição de 30 pontos + 30 pontos + 30 pontos + 30 pontos, totalizando 120 pontos. No final desse processo, a quantidade que você vai ter de impacto tanto econômica quanto ambientalmente é muito maior”. 

A avaliação de ciclo de vida examinou os quatro pontos de entrada da máquina: o detergente, o amaciante, a água e a energia. “Analisamos do berço ao túmulo, pois após sua entrada e utilização, a saída desses efluentes têm destino às estações de tratamento, sendo examinado a fim de ser reutilizado e voltar a ser recurso natural”, completa a professora.

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