Pesquisa da Poli-USP desenvolve método para transpor jogos de lógica tradicionais para o formato digital

Principal meta é manter o mesmo padrão de desenvolvimento de competências e habilidades do raciocínio lógico e demais soft skills

transposição de jogos de lógica, do físico ao digital, como metodo de ensino
Transposição de jogos de lógica, do físico ao digital, como metodo de ensino. [Imagem: Reprodução cedida pela pesquisadora]

Um estudo desenvolvido pela Escola Politécnica (Poli) da USP contribui para o entendimento das novas formas de aprender e ensinar. A pesquisa conduzida por Lucy Mari, doutoranda em Engenharia de Computação na Poli-USP propôs um método para transpor jogos de lógica  tradicionais para a versão digital, como forma de proporcionar um melhor aprendizado na disciplina Estrutura de Dados, parte da matriz curricular de cursos de engenharia e tecnologia de Instituições de Ensino Superior do país. “Espera-se que os resultados deste trabalho continuem direcionando o uso de jogos de lógica como formas de construção do conhecimento e de avaliação no ensino de programação, além do desenvolvimento de soft skills (habilidades interpessoais) necessários no mercado de trabalho”, afirma Lucy. 

Lucy Mari, doutoranda em Engenharia da Computação pela Poli e autora do estudo.

A pesquisa intitulada Proposta de um método de transposição de jogo físico para digital no desenvolvimento de competências e habilidades do raciocínio lógico conta com colaboração do Interlab Laboratório de Tecnologias Interativas, sob orientação do professor Ricardo Nakamura, do Laboratório de Linguagens e Técnicas Adaptativas (LTA), representado por Ricardo Luiz de Azevedo da Rocha, e do Grupo de Pesquisa Alpha da Faculdade de Educação da USP, coordenado pela professora Stela Piconez.

A preocupação pedagógica e educacional da pesquisadora surgiu a partir da sua atuação na docência nas áreas de computação, matemática e empreendedorismo. De acordo com ela, estudos apontam que as aulas tradicionais prejudicam a motivação e o aprendizado do estudante. Assim, buscou-se um método de aprendizagem significativo, para o desenvolvimento das competências e habilidades do raciocínio lógico, e que privilegiasse a inclusão educacional por meio  do autoconhecimento. Assim surgiu a ideia da transposição de jogos de lógica do meio físico para o digital e por meio da programação.  

Do cubo mágico ao jogo Paciência 

 Para transpor os jogos do meio físico para o digital, Lucy levou em conta o ‘experimento materialidade’, abordagem que realiza a transição em etapas, a exemplo, neste caso, do clássico cubo mágico; tipo de quebra-cabeça de seis faces e cores. Primeiro, buscou-se desenvolver interfaces de duas dimensões, em seguida de três e, por fim, o uso da realidade virtual.

Em contrapartida aos jogos de lógica que são jogados apenas em duas dimensões, como os de tabuleiro, em que a transposição para a versão digital se mostrou muito satisfatória, os resultados para aqueles que exigem três dimensões foram menos animadores. No caso do Cubo Mágico, que é 3D na versão real, houve algum prejuízo no desenvolvimento do raciocínio lógico em virtude da interface com o usuário e da interação humano-computador. Apesar da motivação inicial,a dificuldade de manipulação no digital levou à desmotivação. 

Transposição do Cubo Mágico para versão digital. Imagem cedida pela pesquisadora

Após essa tentativa com o Cubo Mágico, Lucy Mari expandiu a pesquisa para o jogo de baralho Paciência e. O estudo foi feito dessa vez por meio de uma transposição ao digital, realizada conjuntamente pelos estudantes e mediada pelo educador. Os dados foram satisfatórios; tanto para o aprendizado dos conceitos da disciplina Estrutura de Dados, quanto para o desenvolvimento das competências e habilidades do raciocínio lógico, do pensamento crítico e de outras soft skills para a resolução de problemas.

Com bons resultados, o jogo de baralho foi integrado a aulas na disciplina, sob avaliação de Lucy, de modo que essa transposição físico-digital fosse estudada durante a construção do conhecimento dos conceitos da disciplina. Como informa a pesquisadora , houve ainda autoavaliação dos estudantes, o que reforçou o entendimento e a compreensão das competências e habilidades do raciocínio lógico e dos conceitos da disciplina.

Representação digital do jogo de baralho Paciência. Imagem cedida por pesquisadores

Do físico ao digital e do cotidiano ao conhecimento

A pesquisadora ressalta que por meio da metodologia empregada, os estudantes estabeleceram conexões com os conteúdos de forma transversal, relacionando-os aos os problemas cotidianos, profissionais e acadêmicos. Ela informa ainda que eles conseguiram estabelecer relações de forma a mapear seus pensamentos, auxiliando na resolução de problemas, inclusive em outras áreas do conhecimento. “Os estudantes apresentaram contentamento, engajamento e até felicidade nas atividades do método abordado no Paciência, quando manuseavam o baralho físico para transpor o jogo Paciência para o meio digital”, afirma Lucy sobre a experiência em sala. 

O estudo também mostrou que o aprendizado por meio de jogos gera condições que beneficiam a experiência de aprendizagem. “Ficou evidente o potencial que os jogos de lógica têm na formação do estudante, comprovando, inclusive, ser uma ferramenta de apoio ao docente na superação da desmotivação dos estudantes para o desenvolvimento das competências e habilidades fundamentais”, diz Lucy.

 Ainda de acordo com a autora do trabalho, a tecnologia e os jogos de lógica podem ser utilizados como suporte prático para apoiar os conteúdos computacionais.

Desafios e novas possibilidades da transposição digital de jogos de lógica 

“A contribuição deste trabalho traz luz às possibilidades de melhorias do aprendizado educacional das estruturas de dados, do raciocínio lógico e de soft skills para estudantes dos cursos de Ciência da Computação e Engenharia de Computação”, afirma a autora. De acordo com ela, o uso de jogos de lógica com a intenção pedagógica é uma possibilidade real de melhoria do ensino da computação e que está alinhada às perspectivas e necessidade dos estudantes e da Universidade como um todo – ainda que enfrente desafios. 

“O desenvolvimento do raciocínio lógico e do pensamento crítico podem ser estimulados por meio dos jogos de lógica, porém, para serem utilizados no meio digital, com as mesmas condições do meio físico, os experimentos apresentaram a necessidade de melhorar questões como a interface com o usuário e a interação humano-computador, para que as competências e habilidades do raciocínio lógica sejam preservadas”, afirma a pesquisadora. 

Ainda que com desafios, o método apresentado pode contribuir no meio acadêmico, até mesmo para os educadores da disciplina Estrutura de Dados. “Eles podem replicar o método em suas aulas e obter resultados melhores no processo ensino e aprendizado dos conceitos de Recursão, Pilha, Fila, Lista Ligada e raciocínio lógico”, afirma Lucy.  O projeto em aula pode trazer envolvimento, motivação e engajamento do estudante, além de fazer o educador deixar de ser o detentor e passar a ser o mediador de um conhecimento – o que traz ao estudante sensação de pertencimento.

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