Inflação Global: como atinge o Brasil

Crise dos semicondutores e conflitos geopolíticos agravaram o crescimento mundial

Inflação global (Foto: Getty Images)

A inflação consiste no aumento dos preços de bens e serviços, o que implica na diminuição do poder de compra da moeda. Observa-se que dados econômicos de vários países mostram que o fenômeno é global. Conforme o Fundo Monetário Internacional (FMI) até 2024 é provável que a maioria dos países emergentes e em desenvolvimento não consigam alcançar as previsões de crescimento feitas antes da pandemia. Muitos bancos centrais — como os do Brasil, Rússia e Coreia  do Sul — aumentaram as taxas básicas de juros para tentar evitar uma inflação galopante, o que poderia atrapalhar a recuperação. Desde conflitos geopolíticos até a variante ômicron são ingredientes que fazem o bolo econômico de vários países murchar, inclusive o do Brasil. 

Paulo Feldmann, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, conta que a inflação é fruto da pandemia, pois muitas fábricas deixaram de produzir por determinado período de tempo. Além da diminuição da oferta, outros fatores contribuíram: o retorno gradual da economia ao normal nos países avançados, a volta do consumo em um nível alto e o alto auxílio salarial em alguns países. Subiu o consumo e caiu a oferta, e assim os preços aumentaram.

Com milhões de pessoas em quarentena e em regime de teletrabalho, a venda de notebooks e outros equipamentos eletrônicos decolaram. Porém, esse fenômeno coincidiu com o período de pouca oferta pois as fábricas estavam fechadas, esse acontecimento desencadeou a crise de semicondutores e chips. As fabricantes priorizaram o fornecimento para empresas de aparelhos mais sofisticados tecnologicamente como celulares que os automóveis, que necessitam de poucos chips simples.

Além disso, a produção de chips foi prejudicada também com o incêndio de uma das fábricas no Japão, o frio extremo nos Estados Unidos e a forte seca em Taiwan. O clima ruim impacta na produção pois é necessário grandes quantidades de água no processo. Esses fatores resultaram em uma crise no setor automobilístico.

Aspectos geopolíticos também afetaram a disponibilidade desses componentes. No final do ano passado, os Estados Unidos incluíram a Semiconductor Manufacturing International (SMIC), a maior fabricante de chips da China, em uma lista que restringe o acesso de empresas as tecnologias de ponta desenvolvidas nos EUA. A empresa afirma que a ação a impediu de manter sua capacidade total de produção.

Além disso, a política chinesa “covid zero” influencia na inflação mundial. Como uma maneira de proteger a população contra o vírus, o país estabeleceu, entre outros tópicos, uma quarentena obrigatória de até sete semanas para marinheiros chineses desembarcarem no país. Com isso, muitos navios mudaram de rota, o que atrasa a remessas e mudanças de tripulação, acentuando a crise da cadeia de suprimentos no mundo, já que a China é um dos maiores exportadores do globo.

Uma consequência relevante diante a inflação global foi a alta do Índice de preços Inflação nos EUA, que subiu 6,8% em novembro, a maior desde junho de 1982. Para controlar a inflação, o país aumentou o valor dos títulos, fazendo com que desvalorize o real e que investidores saem de países emergentes, incluindo do Brasil, indo para os Estados Unidos.

Nesse cenário, o Banco Central projeta inflação de 10,2% para o final do ano, segundo o Relatório de Inflação, divulgado no dia 16 pelo BC. Se confirmada a previsão, será a primeira vez que a inflação atinge o patamar de dois dígitos desde 2015. É a terceira pior inflação entre os países do G-20 (organização internacional que reúne as maiores, e mais importantes, economias do mundo). Perde só para Argentina (51,2%) e Turquia (21.31%).

O professor Paulo analisa que a inflação global provoca aumento dos preços principalmente dos produtos industrializados. Ele conta que ao longo dos últimos 30 anos, o Brasil perdeu o protagonismo na Indústria e sofreu um processo de desindustrialização: caiu do 10 ° maior produtor industrial do mundo para 16 °.  “Agora quase tudo que é importante para nós precisa ser comprado no exterior, e com a inflação global estamos pagando mais caro por estes produtos (computadores, eletrônicos, remédios, vacinas, celulares, etc)”, afirma Feldmann.

A inflação brasileira possui algumas especificidades. Paulo explica que a causa da inflação no Brasil é completamente diferente da inflação nos países desenvolvidos. Lá há uma inflação de demanda causada pelo aumento do consumo e aqui há uma inflação de oferta que é causada pelo aumento de preços básicos da economia (como dólar, energia elétrica e gasolina).  Para ele, o problema é que o governo brasileiro errou no diagnóstico e combate a inflação como se fosse de demanda e por isso aumenta a taxa de juros. Essa medida além de não resolver o problema inflacionário vai causar uma recessão e aumento do desemprego. “O governo sabe que há uma inflação de oferta, mas ele quer favorecer banqueiros e rentistas que ganham muito com o aumento da taxa de juros”, destaca Paulo.

O professor comenta que é muito cedo para prever se a expansão da variante ômicron vai prejudicar ainda mais o crescimento econômico mundial. “Tudo indica que a humanidade está mais capacitada para lidar com esta variante e se isso se confirmar o impacto sobre a economia será menor”.

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