Manipulação genética é utilizada para melhorar qualidade nutricional do tomate

Mecanismos envolvidos no controle luminoso e hormonal da hortaliça mais consumida no Brasil têm sido desvendados com engenharia de fotorreceptores

Imagem: Reprodução

A hipótese de que manipular geneticamente os receptores e inibidores de luz vermelha no tomateiro, o Solanum lycopersicum, poderia alterar a produtividade e a qualidade nutricional do fruto — a hortaliça mais consumida no Brasil — foi testada por um grupo de pesquisadores do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da USP, indicando aumento de vitamina E em condições de exposição de luz.

O tomate fornece quantidades significativas de compostos com atividade antioxidante, como carotenóides e tocoferóis. Com a técnica da transgênese e engenharia genética, o grupo produziu tomates em laboratório como ferramenta de estudo para entender os efeitos da ausência de uma proteína na fisiologia e no funcionamento da planta.

Comparando o processo de amadurecimento de dois frutos verdes, um no escuro e outro na luz, aquele que amadureceu na luz produziu um conteúdo maior de tocoferol, a Vitamina E (responsável pela função antioxidante no organismo) — e outros pesquisadores indicam também uma presença maior de vitamina A.

Esses caminhos poderiam ter uma aplicação prática na agricultura, por estarem relacionados ao melhoramento nutricional do tomate. “Seja como for o método, temos que avaliar o conteúdo que foi alterado no genoma da planta”, diz à AUN a professora do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da USP Maria Magdalena Rossi, coordenadora desse trabalhos do departamento com aplicação direta na agricultura.

Para ela, é necessário avaliar cada produto de forma independente e alerta sobre os perigos da má informação sobre o uso da tecnologia da transgenia. No caso do laboratório, eles são usados como uma ferramenta de estudo para entender o controle luminoso e hormonal da qualidade nutricional do fruto. Atualmente, não há tomate transgênico sendo comercializado no Brasil.

Manipulação da sequência genética

O grupo, que trabalha desde 2016 buscando identificar genes e mecanismos que controlam o metabolismo de compostos nutracêuticos em tomateiro, desenvolveu um fruto que possui o receptor de luz (fitocromo) sempre ativo, sempre degradando a proteína inibidora do gene (PIF4) responsável pela produção de Vitamina E, o que gerou maior qualidade nutricional. A diferença se dá porque o gene fundamental para a produção de vitamina E, é super induzido na luz, tendo baixa expressão no escuro.

Eles tentaram mimetizar a luz, outras mudanças genéticas para tentar fazer com que o fruto “enxergasse” luz quando ela não estivesse presente. Estudando, então, desde a percepção da luz até a resposta fisiológica do tomate.

“As plantas também tiveram um número muito menor de flores e de frutos. O inibidor de sinalização luminosa é muito importante para manter a produtividade. [Mas] a planta selvagem possui muito mais frutos e flores que as plantas com pouco inibidor”, comenta a professora. Esse mecanismo foi desvendado pela doutoranda Daniele Rosado, mostrando que o inibidor da percepção luminosa regula proteínas ligadas ao processo de floração.

“Trabalho de joalheria”

Recentemente, o grupo trabalhou com a retirada de outra proteína inibidora, que também aumenta a produtividade. O projeto segue vigente até 2022, mas novas hipóteses surgiram e podem se desenvolver em novas pesquisas. “Depois podemos transpor esse conhecimento a um programa de melhoramento, não necessariamente com transgênicos, mas com os mesmos efeitos desejados”, diz Rossi.

No caso da aplicação da biotecnologia para desvendar esses mecanismos, cada pesquisador vai somando um grão de areia, uma peça de quebra-cabeça, para propor e testar hipóteses quando há um panorama mais amplo. “Um trabalho de joalheria”, como destaca a coordenadora. A pesquisa desenvolvida por eles estuda todas as variáveis envolvidas e, por isso, são processos longos, com resultados que vêm de anos de pesquisa.

“Isso de pesquisa aplicada e pesquisa básica é uma questão de tempo e de conhecimento. Precisamos de conhecimento para avançar tecnologicamente. Tão simples e tão complexo quanto isso”, diz Rossi. O projeto, ainda que possa ter aplicabilidade prática na agricultura, procura antes desvendar mecanismos que contribuem para ampliar a engenharia dos fotorreceptores e ampliar o conhecimento existente até então.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*