Acervos de memória são essenciais para educação e conquista da representatividade

Live da 5ª Semana Nacional de Arquivos debate ações educativas com acervos de arquivo e memória

Imagem: Reprodução

Os acervos remetem ao passado, à acumulação de vestígios que se materializam em documentos, em bens ou em patrimônio, como definiu a doutora de História da Educação Azilde L. Andreotti em um de seus artigos. 

Entre os dias 7 e 11 de junho deste ano, foi realizada a 5ª Semana Nacional de Arquivos com o tema “empoderamento de arquivos”. Algumas das discussões levantadas durante o evento, abordaram os desafios de se incorporar a diversidade e incluir diferentes vozes e histórias à teoria e a prática arquivística atual. 

Na Mesa 3 do evento, cujo foco era acervos de memória e educação, estava em pauta a representatividade das mulheres, dos negros e trabalhadores; a busca pela construção de novos diálogos para a sala de aula,  através do estudo de documentos e realização de ações educativas com os acervos de arquivo e memória. O debate, promovido pelo Arquivo Público Municipal de São Carlos – SP, contou com a participação da educadora responsável pela implantação e desenvolvimento de ações educativas com os acervos do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP, Elly Rozo Ferrari.

Cartaz de divulgação da live (Reprodução: Arquivo Público e Histórico de São Carlos – SP)

Para a professora de História e doutora em Sociologia, Carla Fernandes da Conceição, os documentos históricos são ricas fontes de informação, principalmente quando se estabelecem situações problemas, a partir dos quais é possível levar os alunos a explorá-los, analisá-los e compreendê-los.

Ao longo dos anos, o desenvolvimento de novas tecnologias de armazenamento facilitou o  acesso a acervos e, se antes, os documentos históricos se concentravam em arquivos físicos, agora é possível consultá-los em outros lugares. Dessa forma, há muitas possibilidades para enriquecer o conteúdo das aulas atualmente. 

Em relação ao papel do educador neste processo, o diretor da Rede Municipal de Ensino de São Carlos, Eder Carlos Zuccolotto, ressaltou que “o professor é uma figura muito importante para que se possa trabalhar, valorizar e dinamizar o acervo”. Com isso, para o diretor, o professor seria, então, a ponte condutora dos alunos para os conhecimentos disponíveis nesses arquivos.

Em relação às propostas de planos de aula, os documentos podem ser utilizados simplesmente como ilustrações para reforçar o que foi abordado em sala de aula, fontes de informações sobre determinados grupos ou materiais de introdução para explanação de temas históricos. 

Entre os diversos tipos de documentos que podem ser utilizados para o trabalho em sala de aula, Carla menciona as certidões de óbitos, os processos de habilitação de casamento, processos administrativos da prefeitura, fotografias, jornais, vídeos e livros.

Para explorá-los da melhor forma possível, é importante lembrar que os documentos não falam por si próprios e devem ser investigados, considerando o problema a ser estudado. Nesse processo, é interessante apresentar questões e problematizar o tema que será discutido no presente e descobrir como o mesmo foi abordado no passado. 

Eder lembra que “nunca se pode duvidar da capacidade do aluno de pensar, criticar,  manusear esses documentos” e, para efetuar um trabalho mais eficiente com os alunos, estabelecer métodos para o exame dos documentos também é essencial, mesmo que não sejam fixos e exijam adaptação, considerando diferentes necessidades e realidades.

Através da apresentação dos documentos, seria possível trabalhar, inclusive, a questão da representatividade de grupos marginalizados em nossa sociedade, como mulheres, negros e trabalhadores. É possível ter acesso a sua história e buscar por documentos que prezem pela inclusão da perspectiva desses indivíduos. 

Na busca pela incorporação dessas diferentes vozes, Carla usou, como exemplo, o documentário “Flores de Maio: História da Comunidade Negra de São Carlos”, que traz diferentes narrativas e mostram o processo de construção da identidade negra no município de São Carlos. 

Pensando além dos muros da escola, Zuccolotto afirma que é preciso “criar espaços de educação, vivência e aprendizado”. “Aqui em São Carlos, nós temos vários patrimônios físicos, que são espaços de memória, como casarões, fazendas antigas, que podemos utilizar para construir narrativas e levar os alunos para conhecerem algo em relação à memória e à história”, exemplificou Carla. 

Quando o aluno faz essa análise mais profunda, o processo de aprendizagem dele do contexto histórico abordado é muito mais amplo e é possível que ele construa sua própria aprendizagem. Carla também menciona o método comparativo, que possibilita que o aluno confronte as imagens, as descrições e construa uma análise mais crítica.  

No caso do Instituto de Estudos Brasileiros, Elly Rozo explica que há uma característica peculiar, já que é um instituto dentro da Universidade de São Paulo e foi, primeiramente, um centro de pesquisa. 

“Ele vem como uma área de expertise e de pesquisa, no sentido de como se desenvolve a educação dentro de amplos níveis, para que públicos que não são pesquisadores acadêmicos pudessem ter acesso e a gente pudesse trabalhar conceitos contemporâneos – tanto de preservação, como de utilização desses acervos”, afirma Elly. 

Elly também explica que “os programas foram surgindo no Educativo por demanda. A gente decidiu ao invés de pensar o que seria importante para os professores e comunidade, esperar que esse público viesse e dissesse o que queriam para criar os programas”. 

Para abordar a representatividade nos acervos, a educadora destaca a importância justamente dessa demanda. Nesse sentido, ela destaca a possibilidade de construção de perspectivas diversas dentro dos arquivos, por meio da busca de documentos que tragam vozes suprimidas pela história, e o processo considera também que é possível estudar todas essas questões pelas ausências identificadas nestes materiais. “As ausências dizem muito para um instituto para se remodelar e pensar sobre o que falta, o que eu quero aqui dentro, qual representatividade não está aqui. Quem vai requerer isso são os pedidos”, destaca. 

Por fim, Eder Zuccolotto destaca que os acervos se mantêm vivos à medida que os procuramos e que é necessário despertar a sede por esse contato nos alunos. “Toda vez que a gente trabalha com essas vozes suprimidas no contexto histórico é o momento de darmos vida a esses personagens excluídos, demonstrar que não é porque eles não foram retratados nos livros oficiais que não fazem parte da história”, conclui.

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