Educação pública tem alto impacto na redução da desigualdade

Nota de Política Econômica do Made, grupo de pesquisa da Universidade de São Paulo, aponta os resultados do serviço público de ensino sobre a disparidade brasileira

[Foto: Assessoria Alesp]

Estudo do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made) da Faculdade de Economia e Administração da USP, mostra que, entre os anos de 2017 e 2018, a educação pública reduziu o índice Gini (medidor de desigualdade) entre 5,22%, segundo os gastos reportados na Pesquisa dos Orçamentos Familiares (POF), e 9,62% de acordo com o investimento por aluno divulgado pelo Inep. Esse impacto coloca a educação pública como um dos principais eixos para a redução da desigualdade no país.

“O gasto público com educação tem se tornado mais progressivo e tem contribuído para reduzir a desigualdade em uma magnitude cada vez maior, o que pode ser identificado pelo impacto no Gini”, afirma em entrevista Matias Cardomingo, pesquisador do Made e mestrando em Economia na FEA. 

A pesquisa reforça conclusões anteriores, porém agora utilizando de uma nova fonte de dados referentes aos serviços não-monetários de educação registrados pela Pesquisa dos Orçamentos Familiares. O pesquisador Matias Cardomingo informa que a importância dessas informações sobre os orçamentos familiares se dá por serem complementares aos outros dados. Enquanto que a POF é feita de baixo para cima, trata-se “daquilo que a família compreende do serviço público, como ela valora aquilo e depois reporta ao IBGE”, as informações do Inep são feitas de cima para baixo, isto é, “são feitas com dados administrativos, pega a folha de gastos do município, do estado e da União, e contabiliza o que é gasto com salário, manutenção e aí ele divide pelo número total de alunos”, explica.

Progressividade do gasto

Ainda segundo a Nota de Política Econômica do grupo de pesquisa, o sistema público de educação apresenta uma alta progressividade, ou seja, gasta-se mais com quem ganha menos. A pesquisa aponta que os 40% mais pobres do país recebem apenas 9,31% da renda total, mas recebem entre 52,99% e 55,24% do total gasto com educação pública, enquanto que os 20% mais ricos, que concentram mais de 60% da renda, recebem apenas entre 10,47% e 12,24% do gasto educacional. Cardomingo explica que “isso é algo que simboliza o que é a progressividade do gasto. As pessoas que ganham menos na distribuição do mercado, são as pessoas que ganham mais na distribuição do serviço público”.

A pesquisa também informa que o gasto público corresponde a 93% do total gasto em educação pelos 10% mais pobres do país. O que significa dizer que essas famílias tiram apenas 7% do próprio dinheiro para financiar o ensino de suas crianças e adolescentes. Já para os 10% mais ricos da população brasileira, a participação do gasto público é de apenas 13,3%. Essa diferença se deve sobretudo ao gasto privado por essas famílias ser maior, optando por buscar escolas particulares, por exemplo.

Ciclo Básico

A Nota técnica informa que todos os níveis educacionais apresentam progressividade, porém aquele que mais contribui para a redução da desigualdade é o ensino básico, principalmente o fundamental. Esta etapa educacional é responsável por uma “redução entre 3,08% e 6,27% do Gini inicial. Esse efeito está relacionado tanto ao tamanho considerável dos recursos alocados nesse nível, quanto à grande progressividade observada desses gastos. O ensino médio público também aparece aqui como de grande relevância para essa queda, com uma redução no Gini entre 1,20% e 2,05%”.

Um dos fatores para essa maior progressividade do Ensino Básico se relaciona com o acesso aos diferentes níveis da educação e a composição demográfica das famílias de cada faixa de renda. “Há mais crianças entre as famílias de menor renda, resultando em maior benefício do Ensino Fundamental, por exemplo, do que nas famílias dos 10% mais ricos”, explica o Made.

Ensino Superior

O Ensino Superior brasileiro ainda apresenta a menor progressividade entre todos os níveis educacionais, sendo o serviço público de educação mais acessado pelas parcelas mais ricas da sociedade e de menor participação na renda das famílias de menor renda. “É o que menos contribui para a redução da desigualdade, mas até ele passou a ser progressivo pela política sistemática de inclusão nas universidades públicas através dos critérios raciais e socioeconômicos, que aos poucos estão mudando quem são as famílias beneficiadas por esse serviço de ensino superior”, informa o mestrando Matias Cardomingo. 

Apesar de um certo senso comum identificar as universidades públicas como geradoras de desigualdade, o estudo demonstra que na verdade, hoje, o ensino superior é neutro ou até mesmo ajuda na redução dessa disparidade. Porém, é verdade que a maior parte do total dos gastos públicos recebidos pelos 10% mais ricos se trata justamente desse nível. 

Para Cardomingo, as universidades públicas devem fazer com que todos tenham condição de permanecer nela. “As políticas de permanência talvez sejam as que mais precisam de atenção no ensino superior. Existe no âmbito nacional o fundo de permanência, que são políticas menos debatidas publicamente e menos estruturadas”.

Os programas de permanência são, junto com as cotas, uma das políticas mais necessárias para o aumento da inclusão no Ensino Superior. Porém diversos problemas são relatados por alunos de baixa renda. Denúncias nesse sentido são feitas dentro da própria Universidade de São Paulo, uma das mais conceituadas instituições do Brasil, de acordo com o Ranking Universitário Folha 2019. Segundo dados da Divisão de Promoção Social da Superintendência de Assistência Social da USP, em 2019 havia 7500 contemplados pelo Programa de Apoio à Permanência e Formação Estudantil (PAPFE), enquanto que em 2020 esse número caiu para 3540 estudantes. Uma queda de 52,8% dos contemplados. 

Importância do serviço público

Para o pesquisador Matias Cardomingo, a forma como o Brasil decidiu prover o serviço público, de forma universal e gratuita, contribui para o acesso a direitos essenciais. “No caso da educação é algo que a gente sabe a relevância, não só em termos econômicos, mas em termos de cidadania, das pessoas terem uma formação cidadã para leitura e compreensão do mundo”, afirma. Ele ainda aponta para a possibilidade de todo o sistema público de educação trabalhar a favor da progressividade. “A conclusão e contribuição do estudo, é que, para além da dimensão da educação na redução da desigualdade, existe a dimensão do serviço público gratuito e universal tendo um impacto significativo na desigualdade do nosso país”, finaliza Cardomingo. 

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