Dengue e Covid: estudo publicado pela USP comprova relação de risco entre as duas doenças

Pesquisa de campo realizada em abril de 2021 em Mâncio Lima, no interior do Acre. [Imagem: Moa Lab]

Em maio deste ano, a revista Clinical Infectious Diseases publicou estudo realizado por pesquisadores do grupo Moa Lab, da Universidade de São Paulo, que atesta que pessoas previamente infectadas pelo vírus da Dengue possuem duas vezes mais chances de desenvolver sintomas de Covid-19.

O grupo de pesquisa do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB-USP), iniciou seus estudos há sete anos, quando o professor e coordenador do Moa Lab teve a ideia de iniciar um estudo sobre a endemia de Malária e o tratamento falciparum em uma região no interior do Acre, no Vale do Juruá. Com a pandemia, o grupo readequou sua linha de pesquisa para atender às novas necessidades sanitárias da área e passou a coletar amostras de material biológico para estudo do Sars-Cov-2 no município de Mâncio Lima, localizado no Vale.

Essa nova frente de atuação abriu caminhos para um estudo inusitado, após contato com o neurocientista Miguel Nicolelis, que estudava uma possível ligação entre a Dengue e o Covid-19 a partir de regiões com baixa transmissão do Sars-Cov-2 e alta incidência de dengue, o Moa Lab passou a estudar também essa hipótese comparativa.

Método de análise comparativa

A primeira etapa do método de pesquisa foi recolher novas amostras de material biológico de 1285 habitantes de Mâncio Lima, para detectar anticorpos de Sars-Cov-2. Em seguida, foram identificados aqueles habitantes que contraíram o Covid-19 de forma sintomática, através da análise dos dados preenchidos nos formulários pelos voluntários. Depois, foi realizada uma análise comparativa com a parcela dos indivíduos que, ainda na pesquisa de campo, realizada em setembro de 2019, haviam apresentado anticorpos para o vírus da Dengue.

Com isso, o grupo pretendia averiguar uma possível relação entre os dois vírus, ou seja, se indivíduos previamente contaminados por dengue estariam menos propensos a serem infectados pelo Sars-Cov-2.

Em setembro de 2020, o professor Marcelo, acompanhado de uma equipe de pesquisadores, doutorandos e pós-doutorandos da USP, além de técnicos de laboratório, realizou a coleta de amostras de material biológico dos moradores de Mâncio Lima, utilizando cotonetes específicos para nasofaringe.

Após o período de um ano sem a realização de inquéritos, normalmente realizados semestralmente, devido à pandemia, a equipe coletou os isolados virais para iniciar seu trabalho com o estudo comparativo e para identificação da cepa circulante no Vale do Juruá, a linhagem B 1.1.33.

Após a coleta do material biológico, as amostras seguem até o Centro de Saúde Sentinela para sorologia, ou seja, para a etapa de testagem da presença do vírus e depois são enviadas para um laboratório na capital paulista.

A etapa de sorologia é feita em duas etapas: a primeira para detecção da presença de antígenos Anti Sars-Cov-2. Esse é o teste rápido que está disponível na maior parte dos postos de diagnóstico de Covid-19 no Brasil. No entanto,  por ter uma sensibilidade menor que o do teste molecular as amostras seguem ainda para uma segunda análise.

O RT-PCR (sigla que, em inglês significa Transcrição reversa seguida de reação em cadeia da polimerase), é um teste molecular que detecta a presença do material genético do vírus, o RNA, a partir da conversão dele em DNA (molécula responsável pela codificação genética de todos os seres vivos), por meio de uma proteína chamada transcriptase reversa. A molécula de RNA, então convertida em cDNA, tem o material genético amplificado para a análise.

Após as testagens, foi verificado que 448 participantes tinham anticorpos Anti-Sars-Cov-2, dos quais mais da metade haviam adquirido sintomas de Covid-19.

A dengue e a pandemia: riscos mútuos

Com a identificação dos indivíduos que contraíram Sars-Cov-2 e também com os dados obtidos em 2019, que indicaram que cerca de 475 participantes possuíam anticorpos para dengue, foi possível realizar uma comparação entre a parte dessa população que foi exposta a ambos os vírus e obtiveram os sintomas de Covid-19 e aqueles assintomáticos.

A partir dessa análise, os pesquisadores do Moa Lab conseguiram identificar que, a infecção prévia por dengue não altera as chances de um indivíduo ser infectado pelo Sars-Cov-2. No entanto, ainda assim, há um risco duas vezes maior de contrair a forma sintomática da doença.

Ainda não há evidências sobre as causas desse fenômeno, os pesquisadores apontam para possíveis razões sociodemográficas, e afirmam a importância da vacinação e das medidas sanitárias contra a dengue.

Para compreender a pesquisa na íntegra, acesse o artigo Interacting Epidemics in Amazonian Brazil: Prior Dengue Infection Associated with Increased COVID-19 Risk in a Population-Based Cohort Study no seguinte endereço eletrônico: https://academic.oup.com/cid/advance-article/doi/10.1093/cid/ciab410/6270997. Conheça também o trabalho do grupo de pesquisa Moa Lab, acessando seu a o podcast no Spotify ou o perfil no Instagram.

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