Saúde mental e alimentação são debates importantes durante a pandemia

Pesquisa realizada na USP se aprofunda em mudanças comportamentais e suas consequências durante a pandemia

No início da pandemia foram comuns cenas de prateleiras vazias em supermercados Foto por Kate Trifo em Unsplash

No início da pandemia, acreditava-se que o isolamento duraria pouco tempo. Com esse pensamento, muitas pessoas precisaram fazer mudanças em seus hábitos. Mudanças alimentares, mudanças na frequência de atividades físicas, nas interações sociais e consequentes variações emocionais têm sido comumente observadas na sociedade.
A pandemia, entretanto, não durou pouco tempo, mas as pessoas alteraram alguns de seus costumes. Foi buscando entender essa nova realidade que os pesquisadores Lara Natacci, Leonardo Dias Negrão e Elizabeth Torres, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, resolveram iniciar uma pesquisa mais aprofundada sobre a relação entre as mudanças comportamentais trazidas pela pandemia e a saúde mental relatada pela população.

Em entrevista, Lara Natacci, nutricionista, mestre e doutora pela Faculdade de Medicina da USP explica a primeira delas: a alteração de humor. São dois os principais processos que acontecem no cérebro e podem ter relação com alterações de humor. 

É preciso primeiramente considerar que o cérebro é um tecido metabolicamente ativo, portanto produz muitos radicais livres. Assim, alimentos de origem vegetal são essenciais por terem compostos antioxidantes, que neutralizam a produção de radicais livres. Além disso, deve-se levar em conta os processos inflamatórios: “todas as alterações de humor e distúrbios de humor têm relação com os processos inflamatórios”, explica Lara. A pesquisadora conta ainda que o consumo de alimentos ricos em antioxidantes, como ômega-3, ajuda a reduzir esses processos inflamatórios e, consequentemente, resulta em menores chances de desenvolvimento de distúrbios emocionais, como ansiedade ou depressão. 

Além disso, é importante destacar que a relação entre alimentação e emoção é bidirecional, conta Leonardo Negrão “tanto a emoção do indivíduo, quando está alterada, pode levar a um comportamento alimentar compulsivo, como também a qualidade da nossa alimentação pode gerar maior estresse, e risco do desenvolvimento de sintomas ansiosos ou depressivos”. O pesquisador explica que o excesso de carboidratos simples e gorduras saturadas pode aumentar os riscos de surgimento desses sintomas. Mais uma vez, isso ocorre devido aos processos inflamatórios, como comentado pela pesquisadora Lara Natacci. 

Quando se fala de sono e exercício físico, os pesquisadores explicam sobre a ação do BDNF (Fator neurotrófico derivado do cérebro) e sua influência sobre a saúde mental, memória e aprendizado. De maneira simplificada, o BDNF estimula o crescimento, desenvolvimento e manutenção das células do cérebro de forma positiva, e a produção desse fator é maior quando se dorme bem e se pratica atividade física regular. 

Atualmente, algo que atrapalha a regularidade do sono é o uso de celular e equipamentos eletrônicos antes de dormir. Elizabeth diz que “a luz azul [que sai do celular, do computador e da TV] estimula o cérebro e faz com que a pessoa não durma”. Isso ocorre porque a exposição à luz, principalmente azul, acarreta na redução da produção de melatonina, que é o hormônio responsável por fazer as pessoas dormirem. 

Como não era possível examinar e entrevistar os pacientes pessoalmente durante a pandemia, o grupo optou por desenvolver a pesquisa através de um formulário online.  Com perguntas relacionadas à frequência de atividade física, hábitos alimentares, sono, estresse, ansiedade e depressão, os pesquisadores buscaram traçar um panorama geral da sociedade pandêmica. A partir disso, eles pretendem entender como a pandemia pode alterar os processos citados anteriormente. 

Ainda que a análise dos dados obtidos não esteja concluída, a pesquisa obteve o total de 1004 participantes e pesquisas semelhantes foram desenvolvidas em outros lugares e, em sua maioria, apontaram para um aumento do consumo de fast food e uma diminuição do consumo de frutas e legumes durante a pandemia. Um ponto interessante é que, no início da pandemia, alguns produtores apontaram um aumento na demanda de frutas cítricas, como laranja e limão, que são ricas em Vitamina C. A tendência é que os resultados desta pesquisa sejam semelhantes.

Os pesquisadores explicam que é normal e esperado que, durante uma situação de crise mundial, as pessoas se estressem mais e consequentemente mudem seus hábitos e comportamento e relatem alterações nos níveis de ansiedade e depressão. 

É possível acompanhar os resultados da pesquisa e outros comentários da professora Lara Natacci pelo seu Instagram, @laranatacci. 

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