Entenda o projeto financiado por Bill Gates que pretende “cobrir o sol’”

O objetivo é reduzir o aquecimento global por meio de uma barreira que dissiparia a luz solar

Créditos: CNBC

Antes da pandemia da Covid-19 surgir e causar mais de 2 milhões de mortes pelo mundo, Bill Gates já falava sobre a ameaça de um vírus há anos atrás, em 2015. Mais recentemente, em entrevista ao jornal El País, Gates fez um novo alerta: “A mudança climática terá efeitos muito piores que a pandemia”. Uma possível solução para esta tragédia? Cobrir o sol com poeira.

O fundador da Microsoft está financiando, junto a outros investidores, um estudo ambicioso da Universidade de Harvard, com o objetivo de frear o aquecimento global. O Experimento de Perturbação Controlada Estratosférica (SCoPEx) pretende enviar, todos os dias, mais de 800 aviões à estratosfera para pulverizar poeira atóxica de carbonato de cálcio (CaCO3), criando uma barreira para os raios solares.

“Com isso, é criada uma espécie de espelho refletor e parte desses raios é refletida de volta para o espaço, impedindo a passagem de toda a energia que chegaria aqui na Terra”, explica Tércio Ambrizzi, professor do Departamento de Ciências Atmosféricas do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG/USP).

Em junho, o SCoPEx fará seu primeiro experimento de campo em Kiruna, na Suécia. A Swedish Space Corporation lançará um balão com pequenas quantidades de pó de calcário a 20 km da superfície. Custando US$3 milhões, este teste inicial servirá de base para um segundo experimento, no qual a poeira de CaCO3 será, efetivamente, lançada na atmosfera.

Já existem evidências de que a poeira poderia reduzir a temperatura. Os pesquisadores se inspiraram no efeito provocado pelas erupções vulcânicas, que expelem sulfato na atmosfera e, com isso, são capazes de modificar o clima. Ambrizzi conta que um dos grandes exemplos é o Monte Pinatubo, que explodiu nas Filipinas em 1991. “Esse vulcão jogou uma quantidade gigantesca de fuligem na troposfera e início da estratosfera, criando um cobertor na região equatorial tropical, que é a que recebe a maior quantidade de energia solar”, afirma o docente. “Naquele ano, um único vulcão foi capaz de abaixar a temperatura média do planeta em 0,5ºC”.

Além da queda nos termômetros, outros efeitos adversos foram atribuídos ao Pinatubo, como ciclones devastadores, a exemplo do Furacão Andrew, que atingiu Bahamas e Estados Unidos em 1992, um inverno rigoroso na Nova Zelândia no mesmo ano e chuvas intensas que, em 1993, colocaram o oeste dos EUA embaixo d’água. A intervenção climática descontrolada é evidente e parece ser, também, uma preocupação dos cientistas em relação ao SCoPEx.

Monte Pinatubo em erupção nas Filipinas, em 1991. Créditos: Arlan Naeg/AFP

Consequências da poeira

O projeto apoiado por Bill Gates é controverso na comunidade científica, onde não há consenso sobre sua efetividade. Os pesquisadores não sabem, ao certo, a quantidade apropriada de carbonato de cálcio e nem se esta é a substância mais adequada para ser lançada na atmosfera. 

Um dos efeitos colaterais da iniciativa pode ser, justamente, a mudança extrema do clima. “Suponha que eles consigam abaixar a temperatura, mas que não tenham controle sobre a circulação atmosférica que existe na estratosfera e essa poeira vá para outras regiões que são altamente produtivas em termos agrícolas”, aponta Ambrizzi. “Elas precisam de uma quantidade maior de energia solar e, simplesmente, se criaria um cobertor, que diminui a temperatura e afeta a produção. Isso pode gerar uma grande crise”. 

Há ainda consequências políticas, como as compensações pela interferência ambiental em diferentes países e o enfraquecimento de iniciativas para combater a emissão de gases nocivos e esgotamento dos recursos naturais. 

“As pessoas precisam ter consciência de que o aquecimento global é uma realidade e que já estamos sentindo seus reflexos: mudanças nos sistemas meteorológicos, ondas de frio e de calor mais intensas que o normal, períodos extremos de chuva e de seca”, afirma. “Tudo isso nos afeta diretamente e, somente por meio de uma ação sustentável, que preserve o meio ambiente e diminua as emissões de gases do efeito estufa, é que vamos conseguir minimizar esses impactos num futuro próximo.”

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