Os efeitos da pandemia do Covid-19 na voz do professor

Sensação de cansaço, secura, dor e desconforto, além do esforço ao falar e voz fraca são indicadores de que a saúde vocal da pessoa pode estar comprometida

Pessoa com dor de garganta [Fonte: GettyImages]

Em vista da suspensão das aulas presenciais e a necessidade de adaptar as formas de ensino durante o ano de 2020, a pesquisadora Katia Nemr, docente do curso de Fonoaudiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e responsável pelo Laboratório de Investigação Fonoaudiológica – LifVOZ deu início a uma pesquisa em busca de entender qual seria o impacto dessa mudança na voz dos professores que continuam o trabalho docente de forma online. 

O projeto “Covid-19: o impacto na voz do professor no período de distanciamento social devido a pandemia” foi realizado no ano passado com a participação de professores de todos os níveis de educação. O objetivo, segundo a professora, é “levar para sociedade, para esse grupo de profissionais, algum tipo de ajuda para que os impactos na voz e as adaptações ocorram de uma maneira mais tranquila, com menos impactos prejudiciais a voz desse professor”.

Os professores são um dos grupos mais estudados do mundo em relação a problemas vocais, que podem ocorrer tanto por conta de fatores de natureza individual quanto da própria profissão. Apesar da precisão vocal não ser uma exigência para ser professor, o cansaço, o estresse, as condições acústicas do ambiente e a necessidade contínua de horas de comunicação oral são fatores que contribuem para prejudicar a saúde vocal de docentes. 

No contexto da pandemia, que além do uso de plataformas de web-meetings para realização das aulas remotas demanda do professor a gravação de vídeo-aulas e áudios , o desgaste físico-emocional decorrente do isolamento e da necessidade de cuidar da família se torna por vezes maior. 

Apesar da importância dos cuidados de voz para a profissão, é comum que os professores não consigam reconhecer problemas e os maus hábitos vocais que praticam. A sensação de cansaço, de secura, de dor e desconforto, além do esforço ao falar e a voz que se enfraquece no decorrer do dia são indicadores de que a saúde vocal da pessoa pode estar comprometida. 

Hábitos de vida pouco saudáveis também contribuem para o surgimento de problemas vocais, como a afonia (perda parcial ou total da voz em virtude de lesão nos órgãos da fonação) e disfonia (alteração ou enfraquecimento da voz). Tais condições comprometem o exercício profissional e podem desencadear distúrbios mais severos. 

O consumo de diuréticos como a cafeína, chá-preto e refrigerantes, assim como o uso de nicotina, anti-histamínicos e corticosteróides são responsáveis pela desidratação das mucosas, causando a sensação de secura e vontade de tossir. O fumo, em particular, provoca a tosse crônica, o aumento de produção de secreções e o envelhecimento precoce das estruturas da laringe. Tudo isso contribui para o aparecimento de sinais de abuso vocal e, em casos extremos, pode levar ao câncer de cabeça e pescoço. 

Além do questionário, o LifVoz enviou aos professores interessados vídeos instrutivos com orientações de como a voz é produzida, além de informações sobre todas as atividades desempenhadas pelo professor que podem impactar-lá — sejam fatores pessoais, alérgicos ou ambientais (dar aula em lugar com muito ruído, ar condicionado ligado). “Enfim, uma série de fatores, por exemplo, ergonômicos, como altura da cadeira no computador agora na atividade remota. Orientamos para que o professor esteja num local da casa com menos ruído, numa posição mais confortável. E também fatores organizacionais, como o número de aulas que o professor dá por dia”. 

Não são só os professores que necessitam de ter cuidados com a voz. A hidratação diária, a inclusão de frutas e vegetais na dieta e o uso de soro fisiológico são exemplos de práticas boas para a saúde vocal, pois contribuem para uma mucosa faríngea menos frágil e desidratada. Engolir em seco ou beber água sempre que tiver vontade de tossir ou “arranhar a garganta” é uma dica que pode ajudar a não tensionar exageradamente a estrutura vocal.

Apesar da comunicação ter como intuito a transmissão de informações, ela envolve muitos fatores, como expressividade, gesto, entonação e frequência da voz. Tudo isso contribui para que o produto final seja mais ou menos efetivo em seu objetivo. Como afirma a professora Katia, o desejado é que “a comunicação se venha de uma maneira mais confortável, mais efetiva e atingindo os seus objetivos sem impactos negativos na sua comunicação, pelo contrário, que possa otimizar essa comunicação com uma boa produção de voz, uma boa expressividade e o máximo de conforto”.

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