Imersão em realidade virtual é usada para compreender estruturas moleculares

Óculos de realidade virtual inserem o usuário em um novo ambiente; os controles permitem que ele se movimente e interaja com o espaço [Imagem: Pixabay]

O laboratório Sampa (Simulações Aplicadas a Materiais: Propriedades Atomísticas) do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP), vem realizando um projeto que busca estudar e desenvolver materiais com o uso de realidade virtual. Por meio de óculos de simulação, os mesmos de jogos eletrônicos, pode-se entender como é ter o tamanho de uma molécula ou caminhar por sistemas microscópicos. 

Para a experiência, são necessários dois controles, semelhantes ao do videogame Nintendo Wii, e os óculos, que tapam toda a visão. Ao colocá-los, o espaço se transforma num ambiente imersivo, onde partículas microscópicas adquirem o tamanho de pessoas. Por meio dos comandos do controle, é possível caminhar em meio a elas, segurá-las e movê-las. Caetano Miranda, docente do Instituto e um dos coordenadores do projeto, explica que o objetivo é extrapolar a posição de observador e interagir com os sistemas estudados. “A primeira fase do projeto foi usar ferramentas que estavam disponíveis para criar uma experiência imersiva no mundo molecular: na escala nanométrica”, afirma o pesquisador. 

Um dos cenários estudados é a interface região de contato entre duas substâncias da calcita com a água, em situação semelhante à existente no pré-sal. A calcita é uma rocha porosa. Quando confinadas em seus poros, as moléculas de água tem um comportamento diferente. Essas diferenças resultam em muitas informações, que dificilmente seriam analisadas ao mesmo tempo. Na experiência, todas as variáveis aparecem simultaneamente.

Segundo o pesquisador, a intenção é “se ter uma ideia de como seria ser uma molécula, e de como essas moléculas se comportam próximas às interfaces. Assim, pode-se adquirir uma intuição sobre o sistema”.  No processo, também é usada uma técnica chamada sonificação. Caetano explica que “não se trata de ouvir as moléculas, mas de transformar os dados de sua dinâmica em som”. As propriedades da água são um exemplo. A cada uma das conformações é associada uma nota musical, e todos os sons são ouvidos ao mesmo tempo. 

Por meio das experiências, é possível adquirir novas noções dos sistemas. “Essa é uma das principais ideias do método de realidade virtual: poder fazer testes e observar seus resultados. Vai-se criando uma intuição sobre um ambiente que é contraintuitivo e a que não teríamos acesso diretamente”, afirma o pesquisador. O projeto pode ser usado no estudo de materiais presentes em produção de energia, em baterias e em células a combustível, na indústria automobilística e no estudo da interação de petróleo e gás com rochas e água do mar. É também possível produzir modelos moleculares do cimento, que até hoje não tem sua estrutura conhecida.

Experiências são levadas a escolas públicas

Participam do grupo Sampa pessoas de diferentes formações: físicos, químicos, profissionais da área de nanotecnologia e de ciências de materiais. Tanto pós-doutorandos quanto alunos de doutorado, de iniciação científica e ligados a projetos de extensão. A equipe trabalha em dois eixos: o primeiro ligado diretamente à pesquisa  usa os estudos para fomentar discussões dentro do grupo — e o segundo atrelado à divulgação científica: mostrar como são esses trabalhos para estudantes de fora da Universidade. “Pensamos em como trazer o conhecimento das potencialidades da nanotecnologia para o público geral. Aí entra o uso de experiências imersivas para vivenciar o nanométrico”, conta Miranda.

Óculos 3D construídos com garrafa pet podem ser usados para que a experiência imersiva seja levada além da universidade [Imagem: Alan HR/Reprodução]
Mais recentemente, iniciaram um projeto que vai a escolas públicas e oferece oficinas, onde constrói-se modelos análogos e menos sofisticados desses dispositivos. Isso é feito usando material reciclável, como papelão e garrafas pet. “Você pode montar óculos de realidade virtual e, para as lentes, usamos a própria garrafa pet”, explica o pesquisador. A garrafa é preenchida com água e soldada, e se torna o item óptico. Isso faz com que qualquer pessoa que tenha um celular possa ter uma experiência de realidade virtual olhando para ele, pois a lente cria a impressão de terceira dimensão.

Por meio da interação com o meio, o objetivo do projeto é criar uma noção intuitiva de sistemas aos que não se teria acesso normalmente. Lauro Braz, graduando em Física e pesquisador de iniciação científica no grupo, afirma ter sentido diferença em sua percepção. “É interessante como desenvolver algo te ajuda a compreender o que está acontecendo. Em questões de intuição sobre o sistema em si, a minha percepção mudou bastante”, diz ele. 

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