Ciclistas inalam mais poluição do que pedestres e motoristas

Ainda assim, a bicicleta é um dos meios de transporte mais saudáveis

Estudo analisou a poluição inalada entre diferentes modais de transporte. Foto: Cecília Bastos / USP Imagens.

O carro, o transporte público e a bicicleta são os grandes agentes da mobilidade urbana, mas os efeitos de cada um deles à saúde são bem diferentes. Uma pesquisa feita por Eduardo Rumenig, doutorando da Escola de Educação Física e Esporte da USP, em parceria com o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CEBRAP), buscou identificar como o tipo e padrão de transporte na cidade de São Paulo afetam a vida urbana, em particular a inalação de poluentes e o risco de mortalidade.

Para isso, foram utilizadas três bases de dados: o Qualar, base de dados da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB), que mede a qualidade do ar em diferentes pontos da cidade; dados meteorológicos fornecidos pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET); e a pesquisa “Origem e Destino”, feita pelo Metrô de São Paulo, que avalia o padrão de deslocamento dos paulistanos.

A partir destes três bancos de dados, foram selecionadas duas estações de monitoramento: uma dentro da USP, o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), que tem um dos menores índices de poluição de São Paulo, e outra que tem um dos maiores índices da cidade, na Tietê-Remédios. “Obviamente temos qualidades sócio-espaciais muito diferentes nesses locais, como o tráfego de veículos pesados, a densidade de área verde e ocupação e verticalização do solo”, explicou Rumenig.

A partir destes números e utilizando regressão de outros trabalhos, foi calculado o quanto a pessoa ventila por modal de transporte. Andar de bicicleta e caminhar requerem maior quantidade de oxigênio do que dirigir. “Então converte-se o quanto a pessoa está respirando com a concentração de poluente e calcula o quanto ela está inalando. A partir disso, você consegue calcular o risco de mortalidade a partir da quantidade de poluentes inalados”, esclareceu o pesquisador.

Além disso, também foi levado em conta o tempo médio de viagem de cada um dos meios de transporte para calcular a inalação de poluentes. O resultado obtido demonstrou que os ciclistas são os que absorvem a maior parte da poluição, seguido pelos motoristas e, por último, os pedestres. Os dados também mostraram que a situação piora no inverno, além de comprovar a discrepância entre a região da Cidade Universitária e Tietê-Remédios.

Baseado em um modelo pré-existente, foi possível calcular até que ponto caminhar e andar de bicicleta deixam de ser práticas saudáveis e acabam se tornando danosas, devido à ingestão de poluição. Na região do IPEN não há nenhum risco tanto para pedestres quanto para ciclistas, mas na região de Tietê-Remédios, em certos períodos do ano e dependendo do tempo de exposição, aqueles que utilizam a bicicleta têm maior risco de mortalidade do que se ficassem sedentários.

O trabalho acabou por descobrir quatro regiões de São Paulo nas quais, levando em conta o tempo médio de deslocamento e os índices de poluição, os ciclistas têm os benefícios da atividade física sobrepujados pelos malefícios do ar. “Quem utiliza a bicicleta como ferramenta de trabalho acaba sofrendo os maiores riscos. Os mais vulneráveis são os mais prejudicados”, disse o pesquisador.

Gráfico apresenta as regiões mais perigosas para os ciclistas. Quando o ínidice ultrapassa a marca de um ponto, a atividade passa a ser prejudicial. Imagem: Eduardo Rumenig

O estudo demonstrou tal injustiça sócio-ambiental, que é pouco comentada e investigada. A população de baixa renda tem como principal meio de locomoção o transporte público, enquanto que a população com maior a renda e escolaridade tem o carro como principal meio de transporte e, dessa forma, são os maiores poluentes. Rumenig explicou que “quem usa mais o carro inala menos poluente, já que está ventilando menos, gerando mais externalidade negativa e sofrendo menos consequências”.

Ainda assim, o pesquisador ressaltou que “se conseguíssemos aumentar o volume de viagem não motorizadas e reduzir o uso do carro, a poluição diminuiria para todos. Não estamos incentivando as pessoas a não usarem a bicicleta, muito pelo contrário”. Afinal, apesar de inalarem mais poluição, em geral os riscos de saúde para os ciclistas e para os pedestres são menores do que para os motoristas, graças aos benefícios proporcionados pela atividade física.

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