Igualdade na oferta de ensino pode ser prejudicada com término do Fundeb

Fundo, que expira no ano de 2020, permite complementação de recursos em estados mais pobres

Pesquisa busca analisar a disparidade na oferta educacional entre os estados brasileiros. Imagem: Pexels

O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), um recurso da União, é o principal fundo de financiamento da educação básica no Brasil. De acordo com dados do Ministério da Educação, ele aumenta em dez vezes o volume anual dos recursos federais destinados à educação. Na pesquisa que está sendo realizada pela professora Ursula Dias Peres, porém, os dados coletados permitem comprovar que, muito mais que um auxílio para a educação pública, o Fundeb é também grande responsável pela redução das desigualdades na oferta de ensino entre os estados brasileiros.

Ursula coordena, dentro do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), uma pesquisa sobre o financiamento da educação básica pelos estados brasileiros. Para isso ela conta com a ajuda de uma equipe de alunos da graduação e do mestrado da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP. Ela explica que o principal objetivo do estudo é entender as desigualdades na oferta educacional no Brasil.

A pesquisa consiste em três passos principais. O primeiro deles é a compreensão das receitas dos estados. Já o segundo consiste na avaliação das despesas desses estados, enquanto o terceiro, em análise qualitativa, buscará compreender como são tomadas as decisões em relação à educação em cada estado.

Redução da desigualdade

A primeira etapa da pesquisa, concluída neste primeiro semestre, consistiu no levantamento das receitas dos estados brasileiros ao longo de 14 anos, de 2002 até 2016. Nesse processo, a equipe analisou dois tipos de receita. Uma delas foi a receita de impostos e transferências. A pesquisadora explica que essa análise é necessária porque, de acordo com a Constituição Federal, todos os estados brasileiros devem aplicar, no mínimo, 25% de seus impostos e transferências na educação. Esses recursos são aplicados, fundamentalmente, no ensino fundamental e médio.

Já o segundo tipo de receita analisada foi a advinda do Fundeb, ou seja, a parte dos recursos da União que é repassada para que os estados apliquem na educação básica. A inclusão da receita advinda do Fundeb teve que ser um recorte da análise, já que o fundo começou efetivamente em 2007, e a equipe só obteve os dados a partir de 2008.

A partir do primeiro passo do estudo, de acordo com Ursula, já é possível observar alguns resultados sobre ele. O primeiro deles é que há uma variação na porcentagem dos impostos que cada estado aplica na educação. Apesar do mínimo ser 25%, alguns aplicam mais do que isso. Além disso, há uma variação muito grande nas receitas voltadas para o ensino em cada estado. Isso acontece porque alguns possuem uma arrecadação de impostos maior do que outros.

Ursula, entretanto, afirma: “Ainda que, em geral, os estados do sul e sudeste tenham valores mínimos maiores para educação, quando comparamos com as matrículas de cada um desses estados, alguns da região norte têm um valor mínimo considerável”. Ela explica que isso acontece porque, apesar de terem uma arrecadação menor, os estados do norte têm poucas matrículas. Dessa forma, ao analisar o valor por aluno em cada estado, as quantias da região norte tendem a ser maiores que as do sudeste, que possui um número de matrículas bem maior.

O maior resultado, porém, é que de 2008 a 2016, houve uma redução da desigualdade na oferta para educação entre os estados. A professora explica que isso se deve ao fato de que o governo federal passou a colocar recursos efetivos da União no Fundo da Educação Básica. Com esse acréscimo houve uma redistribuição, de forma que o governo completa com recursos os estados que possuem menores valores mínimos, deixando-os mais próximos dos estados mais ricos. “É importante dizer que nós avaliamos apenas as receitas disponíveis para a educação. Isso não quer dizer que os estados cumpriram o que a lei manda e aplicaram tudo na educação. Isso nós vamos começar a avaliar agora”, ressalta Ursula. Ela afirma que no próximo mês começará a elaborar o banco de dados das despesas para levantar valores e avaliar se os estados de fato aplicaram esse dinheiro na educação e de que forma fizeram isso.

Equidade de recursos

Dentre os impactos ocasionados pela pesquisa, a professora cita a melhoria na qualidade de informação relevante que possibilitará melhores tomadas de decisão e uma melhor avaliação de como os recursos estão sendo usados e do quanto essa divisão está sendo equilibrada. “É importante comparar tipos de despesa entre estados buscando o aumento da equidade. O Brasil é muito heterogêneo, então se não houverem propostas que pensem, além da eficiência, em equidade a gente não caminha muito”, afirma.

O impacto mais importante, entretanto, está na importância do Fundeb na última década para o ganho de equidade nos recursos para educação. Isso porque o Fundo tem vencimento em 2020 e as discussões para sua renovação ainda estão em estágio inicial. Na opinião de Ursula, algum projeto em relação ao Fundeb será aprovado. O que está em risco, porém, é a participação que a União terá nessa nova proposta, o que pode comprometer a equidade almejada. Para ela, o ideal seria que essa participação aumentasse de 10% para 17%. “Há o risco de aprovarem uma proposta que reduz a participação da União e isso é um risco para a educação básica. A gente tem que pressionar, ficar atento à discussão”, afirma.  

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*