Estudo sinaliza que vacinação antecipada diminui número de internações de idosos

Imagem: Arek Socha/Pixabay

Uma boa estrutura no sistema de saúde e calendários de vacinação bem localizados ao longo do ano são essenciais para a conquista e manutenção da qualidade de vida da população. Erros em qualquer um desses pontos podem ser muito maléficos, facilitando o aparecimento de epidemias e a sobrecarga de postos e hospitais. Como resultado, além das possíveis perdas humanas, os gastos públicos aumentam e a instabilidade se insere em um setor básico e, muitas vezes, negligenciado: a saúde.  

A pesquisa, realizada pela professora Airlane Alencar, do Instituto de Matemática e Estatística (IME-USP), tem como foco analisar os dados referentes às internações em função de doenças respiratórias na cidade de São Paulo. De acordo com Airlane, a ideia para o artigo surgiu de uma conversa informal com amigas, durante a qual elas, já gripadas, questionaram: “será que a vacina contra a gripe não deveria vir antes?”.

Para responder à esta pergunta, a pesquisadora buscou os dados semanais de internações de idosos na capital paulista no período de 2000 a 2015. A escolha do enfoque na população de mais de 60 anos se deu por considerar que as campanhas de vacinação contra a gripe para idosos existem há mais tempo do que aquelas direcionadas a outros setores. Dessa forma, os dados seriam mais confiáveis e concretos. Todos eles estão disponíveis na internet, mais especificamente no Datasus, o Departamento de Informática do SUS. O trabalho de disponibilização de dados feito pelo Ministério da Saúde é bastante interessante, visto que, em outros países, tais informações não são facilmente acessadas.

Depois de ter os dados em mãos, se inicia a maior parte do trabalho: a escolha do melhor modelo para analisá-los. Airlane Alencar atua na Estatística e, nesta área, são muitas as ferramentas que modelam os dados e constroem as bases de uma discussão. Porém, justamente pela amplitude de possibilidades, a escolha de um modelo é sempre uma grande questão. Quando feita de forma inconsequente ou errada, sem as devidas precauções, ajustes e checagem de todas as suposições dos modelos propostos, toda a análise sai incompleta. Por isso, a pesquisadora enfatiza que “não basta só ajustar [o modelo] e pegar o resultado. O pesquisador tem que checar todas as suposições dele.”.

Da análise dos diferentes modelos e bom ajuste deles com os dados obtidos, surgiu o nome da ferramenta metodológica mais adequada à pesquisa. É o modelo Gamar – Modelo Aditivo Generalizado com Termos Autoregressivos –, um derivado do modelo Gam – Modelo Aditivo Generalizado –, mas que leva em consideração, nas palavras da professora, que “os dados de hoje dependem dos de ontem”. Esta parte é muito importante, já que uma análise de séries temporais não pode deixar de levar em conta a dependência das observações passadas. Veja abaixo um dos gráficos construídos a partir da comparação entre os dois modelos:

Neste gráfico, a porcentagem de internações pode ser vista no meio do traço preto, sendo que o restante é o intervalo de confiança. Tal intervalo mede o quanto a taxa variou com relação à semana de referência – semana quatro – que é a semana de menor número de internações no período delimitado. Pode-se ver que o resultado propiciado pelo modelo Gamar – barras verticais – é mais preciso do que o do modelo Gam – sombra cinza. Um resultado mais preciso indica um modelo mais adequado, no qual o intervalo de confiança é menor e, assim, é maior a chance das previsões a serem feitas se aproximarem da realidade.

O gráfico materializa a relação entre a porcentagem de hospitalizações e as semanas de um ano, sempre com referência à semana quatro. A análise realizada mostra que, já na semana 20, geralmente primeira ou segunda semana de maio, o número de casos de doenças respiratórias que necessitam de tratamento incisivo é grande. “A conclusão é que, como na semana 20 sobe muito, a vacina poderia vir bem antes, em março ou começo de abril”, diz a autora do projeto. As campanhas de vacinação, geralmente, começam no final de abril.  Uma exceção recente foi o ano de 2019, no qual a campanha começou um pouco antes do normal, mais precisamente no dia 10 de abril.

Depois das análises feitas, a partir do conhecimento já gerado sobre como os dados funcionam e se adaptam ao modelo, é a hora de fazer as previsões. Para isso, deve-se considerar que não ocorrerão grandes mudanças no meio, já que não há como um modelo simular todas as possibilidades de intervenção externa. No gráfico abaixo, as previsões são feitas a partir de 2015. Note que o modelo Gamar se aproximou muito mais do resultado observado do que o Gam, o que prova novamente sua adequação. O trabalho foi feito considerando os dados até 2015, o que possibilitou que fossem elaboradas previsões para 2016. Como o artigo foi postado depois de já captados os dados referentes à 2016, Airlane Alencar conseguiu comparar as previsões feitas por sua pesquisa com os dados reais.

Dessa forma, a pesquisa respondeu às perguntas que a motivaram. Ela foi capaz de estabelecer e medir o número de internações tanto dentro do período de um ano, com uma escala semanal, quanto em períodos mais longos, com escala anual. A conclusão é que é provável que, caso as campanhas de vacinação comecem mais cedo, o número de hospitalizações diminua. Quando questionada sobre a importância deste tipo de pesquisas para a formulação de políticas de saúde pública, Airlane respondeu que são importantes sim, mas que muitas coisas já são feitas, o necessário é um cuidado mais contínuo. Por fim, enfatiza: “acho que esses estudos são importantes para evidenciar coisas que já chamam atenção.”.

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