Número de alunos no ensino superior deverá crescer no Brasil até 2035

Pesquisa da FEA-USP traça medidas para alinhar a demanda e a oferta do serviço educacional

Doutorado pensa formas de ampliar a qualidade técnica dos cursos universitários (Foto: Reprodução)

O senso comum acredita que o avanço econômico do Brasil depende da maior disponibilização de cursos de graduação. O pesquisador Luis Fernando Britto da Faculdade de Economia e Administração (FEA-USP) afirma que esse não é o caso. Traçando um modelo, que envolve uma projeção para o futuro do ensino superior do País, ele afirma que o mais importante é o equilíbrio da demanda para a educação no mercado de trabalho. Para a construção do modelo, Luis Fernando Britto utilizou a técnica de sistemas dinâmicos, que permite uma simulação. A partir dela, o pesquisador conseguiu embutir variáveis mais abertas, como relações sociais e obter um resultado matemático.

“Educação é um bem posicional que as pessoas querem adquirir, dessa forma é regido pela demanda do serviço” afirma. Além do aluno, que busca um futuro mais próspero depois do tempo e dinheiro investido em sua graduação, o mercado de trabalho e a sociedade buscam receber algo em troca dos formandos do ensino superior.

“A sociedade espera que com a maior formação dos cidadãos se tenha um desenvolvimento social e econômico maior” afirma o pesquisador. Ele também complementa que o mercado de trabalho espera uma maior qualificação e, também, utiliza o ensino superior como uma forma de filtro para escolher os mais qualificados para suas empresas.

Pesquisador acredita que o governo deveria aumentar incentivos para facilitar ingressos dos alunos nas universidades de alta qualidade (Foto: Reprodução)

Luis Fernando dividiu a oferta do ensino superior em três camadas. Nessa divisão, a primeira é composta pelas faculdades públicas e privadas com maior renome, na qual os professores de maior qualidade e os alunos mais qualificados trabalham. Abaixo estariam as “aspirantes da elite”, faculdades que oferecem um bom serviço de qualidade para um menor número de aluno, mas que não possuem os mesmos prestígios das universidades de cima. A última é formada por faculdades que oferecem cursos de menor qualidade para uma grande gama da população.

De acordo com o pesquisador, o grande problema relacionado à oferta é a grande quantidade de cursos da última camada aliada à desinformação do aluno.“ O aluno acaba escolhendo a mais conveniente para ele, pois, por ser pouco informado, não sabe a diferença entre as faculdades” complementa. O pesquisador ainda pontua que os programas que facilitam o ingresso do aluno no Ensino Superior, como ProUni e Fies, tem gerado uma super oferta de cursos das faculdades que oferecem uma menor qualidade técnica.

De acordo com dados de 2014 do Banco Intercontinental de Desenvolvimento (BID), 9% dos graduandos no Brasil provém de família de baixa renda (FOTO: Reprodução)

A pesquisa usa como base o modelo de Martin A. Trow, sociólogo estadunidense, que dividiu os formandos em três camadas. De acordo com ele, a primeira é a formação da elite intelectual com papel de liderança no País. A segunda camada é composta por uma elite técnica que lidera as funções diárias da sociedade, como os engenheiros e médicos. Os formandos da última apenas ganham um valor agregado depois da graduação e o estudo apenas os adapta para as mudanças sociais e tecnológicas durante o tempo. Um dos detalhes do modelo de Trow, é que as pessoas conseguem atuar em áreas abaixo da sua camada de formação, porém não se consegue atuar em uma posição acima.

O maior problema identificado pelo pesquisador é a falta de casamento entre a demanda e as ofertas do ensino superior. De acordo com Luís Fernando, o Brasil não possui uma demanda de trabalho pela elite intelectual, tem uma camada intermediária espremida e um excesso de funcionários da última camada, ao mesmo tempo em que gera muitas pessoas “com valor agregado”, o que acontece por conta do aumento de cursos em universidades de menor qualidade.

“Não tem muita demanda para a elite intelectual do Brasil, tanto do ponto de vista de inovação, empreendedorismo, pesquisa e liderança política” adiciona o pesquisador. “Ao mesmo tempo, a camada intermediária está espremida, então nos falta mão de obra do dia-a-dia para tocar as coisas, por exemplo, estamos sempre correndo atrás de médicos, engenheiros de qualidade. E acabamos gerando uma sobre oferta de pessoas no setor de baixo”.

O problema desse desequilíbrio é que muitos da elite intelectual são obrigados a retroceder para as outras camadas e atuam em áreas diferentes de sua formação. Além disso, a regressão sucessiva provoca falta de serviço para última camada e a sociedade não abastece todas suas necessidades apenas com a formação do ensino superior.

“Uma das propostas é que o sistema de educação precisa alimentar os três níveis com uma proporção razoável. A política pública pode incentivar o acesso da população no geral para os três tipos de universidades” afirma.

Projeções para o futuro

A partir de dados obtidos a respeito do Ensino Superior no País, o pesquisador chegou à conclusão de que o número de graduandos deverá crescer até 2035, porém, após esse ano, deve iniciar uma queda. “Fatalmente as vagas devem diminuir porque faltará pessoas para cursar”, revela.

Para ele, o governo, por meio de políticas públicas, precisa buscar definir programas para garantir maior qualidade de oferta do serviço educacional ao mesmo tempo em que habilita financeiramente o aluno para que seja possível obter cursos em faculdades de maior renome. Apenas habilitar o fornecimento de cursos em menor qualidade geraria uma sociedade desigual.

“O grande foco nas universidades da camada de baixo, provoca um efeito perverso, com um aumento do valor dos profissionais das elites porque eles se tornam mais valorizados por falta de oferta”, revela o Luis Fernando. “Quando muitos têm o bem posicional igual, o valor da pessoa que tem o diploma acaba ficando mais baixo, o que no fundo aumenta a desigualdade. Marginaliza, assim, até quem não tem um diploma”, completa.

No final, a partir da construção do modelo, entrevistas com especialistas e análise de teóricos do ensino superior, Luis Fernando Britto conseguiu obter um resultado do investimento das políticas públicas nas diferentes camadas das universidades.

“Pensando nesses três cenários, o país que tiver uma maior demanda do mercado de trabalho e formação desses caras da elite, terá um ganho no desenvolvimento do PIB em longo prazo. Se tivermos uma formação forte na camada intermediária e uma maior demanda nessa camada, teríamos um ganho no PIB no curto prazo. Se nos mantivermos com um crescimento na camada de baixo, o sistema educacional acaba não gerando nenhum valor agregado para a sociedade como um todo” conclui.

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