Grupos femininos de economia solidária dão autonomia para a mulher

Segmento se mostra como alternativa a mulheres que não conseguem se inserir no mercado de trabalho formal

Imagem: Reprodução

Segundo o FBES (Fórum Brasileiro de Economia Solidária), o segmento pode ser compreendido a partir de três esferas: econômica, cultural e política. A primeira, caracteriza o segmento como uma forma de atividade econômica baseada na autogestão, em que não há patrões e empregados, pois todos integrantes são ao mesmo tempo trabalhadores e donos. Do ponto de vista cultural, tal prática pode ser definida como uma forma de produção e consumo que não afeta o meio-ambiente e também não beneficia grandes empresas. Já politicamente, a Economia Solidária pode ser entendida como um movimento social, que luta pela mudança da sociedade e por uma nova forma de desenvolvimento, construído pelos indivíduos e não baseado em grandes empresas. Os valores desse desenvolvimento são solidariedade, democracia, cooperação, preservação ambiental e direitos humanos.

Observando tal fenômeno, a pesquisadora Ana Paula Vieira Freire da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, analisou grupos e cooperativas de economia solidária formados majoritariamente por mulheres em sua dissertação de mestrado Mulheres na economia solidária: resistência cotidiana por uma nova cidadania.

“Na verdade, a ideia inicial do projeto era estudar experiências positivas de cooperativismo ou economia solidária”, revela a pesquisadora. “Entretanto, acabei conhecendo o grupo de Mulheres Artesãs da Enseada da Baleia, ligado ao turismo, que participa de feiras de Economia Solidária feminista. A partir dessas feiras, conheci outros grupos de economia solidária formados somente por mulheres. Então, percebi como o tema de gênero não é muito estudado na academia”, comenta.

Em seu estudo, Ana buscou entender a realidade e as condições de vida das mulheres que trabalham na economia solidária. Ela procurou descobrir as razões que as levaram para este setor, a relação dessas mulheres com o mercado de trabalho, o que havia mudado na vida delas após o envolvimento com as cooperativas e qual o significado da prática.

Foi identificado que a busca das mulheres pelo segmento se deve, muitas vezes, à dificuldade de inserção no mercado de trabalho formal que, por sua vez, está relacionada com a questão de gênero. “Geralmente, as mulheres entram nessa forma de trabalho porque não conseguiram outra atividade no mercado formal (emprego com carteira assinada), seja pela idade ou por ter filhos, mesmo tendo escolaridade e experiências anteriores”, comenta. Também foi constatado que a economia solidária pode ser um meio de garantia de autonomia para a mulher. “Nessa forma de trabalho, elas começam a mudar suas relações com a sociedade. Começam a buscar cursos, conhecimento, participar de movimentos sociais, solicitando políticas públicas”, aponta. “A economia solidária tem essa grande função de conectar o econômico com o político.”

Todavia, tais fenômenos não são observados em todas cooperativas. Muitas vezes, em grupos mistos, formados também por homens, acaba havendo uma reprodução das problemáticas de comportamento observadas entre homens e mulheres na sociedade. “Os grupos formados por mulheres acabam despertando para essa consciência, uma vez que elas se identificam nessas dificuldades e buscam se apoiar”, comenta.

Para a realização do estudo, foram realizadas entrevistas com sete mulheres de cinco grupos de economia solidária, os quais são formados em sua maioria por mulheres. Também foram entrevistadas duas trabalhadoras que atuam em ONGs que organizam eventos, cursos e feiras de economia solidária com estas mulheres. A pesquisadora participou desses eventos para entender esta forma de organização.

Ainda há uma grande discrepância na participação de homens e mulheres no mercado de trabalho. Segundo dados divulgados em 2015 pelo IBGE, nas entidades empresariais, homens ocupam 62,3% das vagas, enquanto mulheres apenas 37,7%. “As mulheres têm dificuldade de arrumar emprego, de estudar e se desenvolver, uma vez que são constantemente incumbidas e cobradas dos cuidados domésticos, enquanto isso raramente é um problema para os homens”, critica Ana. “Toda essa responsabilidade deve ser dividida e revista. Corrigir a nós mesmos com uma autocrítica é um começo para um mundo mais justo.”

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