Pesquisa analisa política externa do governo Lula na África

Da criticada cooperação com os países africanos à interatividade com as empreiteiras agora instigadas pela operação Lava-Jato, pesquisador afirma que a política externa de Lula na África deve ir além de ideologismos

Lula entendeu as relações com a África como algo significativo para a política brasileira, visto que grande parte da ONU é composta por países africanos. Arte: Camilla Freitas

Segundo o chanceler brasileiro Antonio Patriota, a política externa do governo Lula foi de combate à fome. A aproximação do Brasil com países do Sul e, dentre eles, os do continente africano, foi uma característica marcante do Itamaraty durante o governo do petista. Com o intuito de estudar essa aproximação, e como se desenvolveu a relação entre as diplomacias brasileiras e africanas antes do governo do PT, o pesquisador Henrique Gerken Brasil, orientado pelo professor do Instituto de Estudos Brasileiros da USP (IEB), Alexandre de Freitas Barbosa, desenvolveu a pesquisa de mestrado intitulada “Relações externas Brasil-África: da política externa independente ao governo Lula”.

Considerado por uma grande parcela da mídia como um político populista, Lula, assim como o também encarado como populista ex-presidente Jânio Quadros, entendeu as relações com a África como algo significativo para a política brasileira, visto que grande parte da ONU (Organização das Nações Unidas) é composta por países africanos. “O Lula sabia falar, ele fazia visitas e no fundo ele estava lá pedindo votos na ONU. Tanto que mesmo depois de seu período, o diretor geral da OMC (Organização Mundial do Comércio), Roberto Carvalho de Azevêdo, e o secretário geral da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), José Graziano, foram brasileiros nomeados basicamente com votos africanos”, conta Henrique.

Infografia: Camilla Freitas

Ao longo da história recente do país, o que corresponde ao governo de Jânio e percorre até meados da Ditadura Militar quando se trata de política externa na África, no entanto, é o chamado discurso culturalista. Nele, os governantes focaram, principalmente, nos laços culturais que unem o Brasil à África e não se aprofundaram para além disso. De acordo com o pesquisador, isso pode ter uma relação com o que se discute hoje sobre Apropriação Cultural, uma vez que elementos africanos eram usados como meios de aproximação entre Brasil e África, e, no entanto, não havia uma discussão acerca da origem e significados desses elementos. Em seu primeiro mandato, conforme aponta em sua pesquisa, Henrique avaliou que Lula implementou parte dessa política para um primeiro contato com o continente. Lembrou até da visita do presidente à Porta do Não Retorno (Ouidah, Benin), com Gilberto Gil, onde chorou e reproduziu um discurso também utilizado por Jânio: o Brasil tem grandes dívidas com a África (fazendo referência à escravidão, simbolizada pelo monumento).

Mas foi em seu segundo mandato que essa relação com os países africanos tornou-se mais sólida através de outro discurso: o da cooperação. “Não foi o Lula que inventou a cooperação internacional, mas ele aprofundou.” Henrique conta que esse foi o diferencial de Lula com relação aos outros presidentes. Ele enxergou o continente africano e aplicou nele não só o discurso culturalista mas, sim, uma política de cooperação, o que claro, gerou críticas de grande parte da mídia e da oposição. “Li recentemente um artigo que dizia que as viagens de Lula à África foram um fracasso porque não aumentaram a corrente de comércio, como se tudo o que se faz na política externa fosse para ganhar dinheiro”. Esse tipo de posicionamento da mídia, por exemplo, foi uma das dificuldades que o pesquisador encontrou para realizar sua dissertação. Segundo ele, grande parte dos analistas, jornalistas e pesquisadores analisavam a política externa do petista através de um viés ideológico afirmando, pois, que se tratava de uma política “terceiromundista”.

“O curioso, o que tentei apontar também na dissertação, é que muita gente que critica o Lula e sua política externa afirma que ela é terceiromundista. Mas ele foi o porta-voz de empresas brasileiras lá no mais puro capitalismo para exploração”. Nesta fala, Henrique aborda a presença de grandes empreiteiras da engenharia civil e da Petrobras na África, empresas estas que estão envolvidas na operação Lava Jato e que mesmo que não tenham se instalado no continente no governo de Lula e, sim, na década de 1970, com Geisel, conforme afirma, marcaram principalmente o governo do petista. Isso se faz presente quando, segundo o próprio delator da Odebrecht, Alexandrino de Alencar, Lula, por ser uma figura popular na África, era usado como “cartão de visita” da empreiteira em palestras que a promoviam.

De acordo com a pesquisa realizada, o que proporcionou essa aproximação, além desses outros fatores apresentados, foi o desenvolvimento econômico nos principais parceiros africanos do Brasil, dentre eles a África do Sul, e no próprio país latino-americano. Lula foi capaz de enxergar nessa conjuntura não só questões econômicas como vantagens políticas tão significativas. O governo atual, por mais que queira cortar gastos com embaixadas, não poderá ignorar, esse avanço. “O Brasil tem que ter mais gastos com diplomacia se quiser ser um país importante. Tem que ter muito mais diplomata no mundo, muito mais investimento no Ministério das Relações Exteriores e entender que ele é um Ministério chave para a posição do Brasil no mundo”.


1 Comentário

  1. Passados alguns anos das viagens de Lula financiadas por empreiteiros investigados e condenados na Lava Jato, o texto se esvazia, pois não menciona os interesses escusos mascarados por viagens diplomáticas com clara intenção de lobby feito por Lula. Em nenhum momento as viagens tiveram propósito humanitário. Tudo era fachada para as empreiteiras e Lula faturarem muito.
    Lula agiu como o diabo travestido de anjo.

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