USP coordena rede de pesquisas na Antártica

Cientistas da Universidade buscam substâncias úteis a partir de algas do continente

foto: Acervo pessoal
Pesquisadores brasileiros realizam coleta de algas no continente Antártico. Crédito: Pio Colepicolo

O  Programa Antártico Brasileiro (ProAntar) é um projeto do governo implementado pelos ministérios da Defesa (Aeronáutica e Marinha), Ciência e Tecnologia e Relações Exteriores, financiado pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), que visa a presença da comunidade científica do país na Antártica e a obtenção de  conhecimentos sobre os fenômenos do continente e sua relevância global. O programa financia diferentes projetos de pesquisas, nas mais diversas áreas, como paleontologia, biologia e oceanografia.

Desde 2009 um dos projetos financiados é o do Instituto de Química da USP (IQ-USP), coordenado pelo professor Pio Colepicolo, com a parceria de pesquisadores de 26 outras Universidades do país e seis grupos internacionais de países como Itália, Estados Unidos, Chile e Argentina.

Inicialmente voltado ao estudo da biodiversidade das macroalgas do continente, a partir de 2014 o projeto recebeu autorização para realizar prospecções, ou seja, fazer coletas na região, — atividade de grande importância. “Nós vemos se essas algas têm algum componente importante que possa ser usado para algumas funções ou distúrbios biológicos”, diz o docente. E como exemplo, o projeto conta com grupos que fazem pesquisas em atividades antioxidantes, compostos com finalidade fungicida, anticancerígenas e leishmanicida, a partir das algas. No Instituto de Química são isolados compostos que têm capacidade de absorver radiação ultravioleta, para produção de loções protetoras, em parceria com a Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP.

Outras substâncias isoladas pelo grupo coordenado pelo docente são os carotenóides, pigmentos naturais de grande importância no mercado nacional e internacional e ácidos graxos polinsaturados do tipo ômega-3 e ômega-6, precursores de hormônios fundamentais para a saúde humana.

Nesse contexto, o trabalho realizado dentro do laboratório se complementa com iniciativas externas gerando resultados práticos para as pesquisas. Ex-aluno de pós-doutorado do professor Pio, Luiz Fernando Mendes é um dos sócios fundadores da Bioativos Naturais, empresa surgida ainda dentro do laboratório do professor e que realiza trabalhos de biorrefinamento sustentável, obtendo  produtos de alto valor agregado a partir de biomassas, usando uma tecnologia denominada “fluido supercrítico” e que, segundo Luiz, é um processo “limpo, sustentável e muito mais rápido”.

A partir de algas coletadas são extraídos os carotenóides, que possuem alto valor pois a grande maioria dos pigmentos utilizados atualmente são sintéticos. “Depois que tiramos os carotenóides ainda sobra uma biomassa protéica que pode ser usada em muitas funções, como produção de cápsulas para atletas, por exemplo”, conclui Luiz.

Para Colepicolo, o projeto é essencial para a busca de novos fármacos que tenham uma alto valor agregado. “É uma forma de fazer pesquisa básica, dentro dos laboratórios e transformá-las em produtos para a sociedade, que possam ter uma finalidade tanto na área médica quanto na área de cosméticos e agricultura, o que é uma transferência importante que pode trazer benefícios para a sociedade em geral.”

Outro ponto que o docente define como importante do projeto é a formação de profissionais qualificados que com ele foram envolvidos, originando teses de mestrado e doutorado, pois a qualificação é uma das missões essenciais da Universidade, segundo o docente.

Importância das pesquisas na Antártica

A Antártica é um dos maiores continentes do Planeta Terra, tendo um papel essencial no funcionamento dos sistemas globais. Além de ser o maior regulador térmico da Terra, influenciando no controle das correntes marítimas e atmosféricas, o continente gelado ainda é a maior reserva de água doce do planeta (70%) e contém inúmeras riquezas minerais e energéticas. Porém, a Antártica é um território Internacional, não pertencendo a nenhum país.

Visando garantir alguns critérios em relação ao continente — como, por exemplo, assegurar o uso pacífico do território, proibindo testes militares na região — 12 países assinaram um acordo em dezembro de 1959 conhecido como Tratado da Antártica, garantindo que os países signatários façam parte de um conselho consultivo para regulamentar as atividades a serem feitas, além de estabelecer bases para a cooperação científica entre esses países nos estudos do continente e sua preservação, essenciais para toda a vida na Terra.

A proximidade do Brasil com a região e as influências diretas dos fenômenos Antárticos no território brasileiro, além da necessidade de estudo da região — cada vez mais fragilizada pelos fenômenos de aquecimento global —  fizeram com que o país se tornasse parte dos Membros Consultivos e signatário do Tratado em 12 de dezembro de 1983. Nesse sentido, o projeto também realiza biomonitoramentos de poluentes metálicos, oriundos sobretudo de navios turísticos que vão à região, gerando grande impactos ao ecossistema antártico. “A gente vai lá, colhe amostras e faz uma dosagem de metais nas algas (elas conseguem absorver e estocar metais com facilidade) então, desde o início do projeto nós temos acompanhado os níveis de metais nelas, porque elas são boas bioindicadoras de poluição por metais na Antártica, que é um ambiente muito suscetível à poluição”, conta Colepicolo.

Em épocas de desastres ambientais crescentes e o uso da ciência cada vez mais voltado para fins bélicos, preservar e estudar a Antártica, garantindo uma cooperação pacífica entre nações, se torna gradativamente um objetivo a ser buscado.

 

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