Aplicação excessiva de algicidas prejudica meio ambiente

Políticas públicas que recomendam utilização são financeiramente inadequadas e ecologicamente irresponsáveis

Créditos: Grupo Sul News

Marcelo Pompêo, professor e pesquisador do Departamento de Ecologia da USP, defende que, a partir de análises científicas, as crises hídricas podem ser previstas com bastante antecedência. Entretanto, as precauções, muitas vezes, são adiadas até se atingir um quadro alarmante. Essa demora na implementação de ações de racionamento, assim como, o não investimento em redução de desperdício e contaminação das águas, para ele, são resultados de uma gestão que vê o manejo dos recursos hídricos como decisões políticas.

O pesquisador aponta que, frente a uma crise hídrica, as políticas brasileiras optam por buscar águas novas, não por tratá-las. O governo de São Paulo, por exemplo, está buscando água no rio Paraíba do Sul e no rio São Lourenço, tentando assim aumentar os índices dos reservatórios. Esse processo gera um aumento de 10 metros cúbicos por segundo no sistema a um custo de R$ 3 bilhões. Segundo ele, além do custo astronômico, haverá um aumento de 8 mil litros de esgoto por segundo em um sistema de tratamento sobrecarregado, já que a Sabesp trata 18 metros cúbicos por segundo e gera-se 35 metros cúbicos por segundo, o que resultará em um aumento na poluição de mananciais.

Ele demonstra que, com essas gestões, não há investimento em coleta e trato dos esgotos, o que acarreta na contaminação de alguns reservatórios, como Billings e Guarapiranga. O despejo dessa matéria orgânica gera um excesso de Nitrogênio e Fósforo que, em um país tropical, que proporciona luz o ano inteiro e temperaturas elevadas, permite uma proliferação significativa de fitoplâncton.

Devido a possível presença de algas e cianobactérias potencialmente tóxicas nessa formação, foi desenvolvida uma legislação que obriga todo gestor de reservatório a fazer um monitoramento do desenvolvimento dessas algas e, na eventualidade de determinados espécimes e concentrações, a tratar a água. A maneira mais usada, nesse controle, é o uso de compostos químicos; o sulfato de cobre pentahidratado e o peróxido de hidrogênio.

O sulfato de cobre pentahidratado é usado, em São Paulo, há 43 anos. São feitas muitas críticas sobre seu uso, já que o cobre não é um elemento biodegradável e permanece no reservatório por muito tempo. Segundo Marcelo, joga-se por volta de 400 toneladas desse composto por ano, o que representa 100 toneladas do elemento cobre. Em função dessas críticas, implementou-se o uso do peróxido de hidrogênio (água oxigenada). Entretanto, esse é um produto ‘genérico’, ou seja, o que houver de biodiversidade será atacado. Atualmente, a Sabesp faz uso dos dois compostos, sabendo que para algumas algas um dos produtos é mais eficiente.

Marcelo Pompêo e seu orientando, Philipe Riskalla Leal, se empenharam em avaliar as concentrações do elemento cobre presentes no sedimento do reservatório Guarapiranga — situado na divisa entre os municípios de São Paulo, Itapecerica da Serra e Embu-Guaçu — com o intuito de avaliar os danos ambientais e os gastos gerados pela aplicação contínua de sulfato de cobre pentahidratado nesses 43 anos. Os resultados foram publicados na dissertação Geoestatística e Ecotoxicologia como ferramentas para gestão de reservatórios: Estudo de caso:Reservatório Guarapiranga, de Philipe Leal.

Para levantar os resultados, os pesquisadores calcularam a área e o volume do reservatório que, correlacionada a um sistema de informação geográfica, permitiu-os, a partir da interpolação de dados (método usado: krigagem), descobrir a quantidade de cobre por metro quadrado no sedimento do reservatório.

O artigo, expõe a aplicação de 17.794 toneladas de sulfato de cobre pentahidratado nesses 43 anos, o que resultou em 4.530 toneladas do elemento cobre depositadas no sedimento do reservatório. Além do levantamento de dados alcançados, a pesquisa transforma essas concentrações em critérios de qualidade, tornando possível a avaliação das regiões sedimentares do Guarapiranga. A taxação é baseada nos padrões e limites propostos pelos guias de qualidade do sedimento do Canadá. Os resultados mostraram que mais de 80% do sedimento do reservatório apresenta-se em condições tóxicas para o ambiente e sua biodiversidade (ecotoxicológico).

 

 

Marcelo Pompêo também acrescenta que, partindo dos dados obtidos sobre a concentração de cobre no reservatório e sabendo o preço de mercado do sulfato de cobre pentahidratado, é possível calcular que foi gasto, em 43 anos, 400 milhões em aplicação desse algicida no Guarapiranga. Somando tal resultado aos 30 milhões gasto em peróxido de hidrogênio (dados liberados pela Sabesp) e partindo da literatura para saber o quanto seria gasto na construção de uma estação de tratamento de esgoto — incluindo compra de terreno — para coleta e tratamento da região Guarapiranga que tem em torno de 1 milhão de pessoas, o pesquisador e seu orientando concluíram que os valores seriam quase equivalentes, ou seja, aproximadamente 430 milhões.

Segundo ele, como estamos em 2017 e não há estação de esgoto para prevenir a entrada de matéria orgânica que causa o surto de proliferação desses organismos, a aplicação de algicidas terá que continuar, e, assim, essa gestão já se mostra financeiramente inadequada. Além disso, a avaliação de qualidade do sedimento também aponta que a gestão tem sido feita de maneira irresponsável e não ecológica, uma vez que essas aplicações tornam o reservatório impróprio para diversas finalidades e tóxico para a biota.

Mesmo comprovada a ineficiência desse tipo de manejo, em 2015, foi gerada a resolução Conama 467 que disciplina que procedimentos desse tipo (usados em São Paulo) possam ocorrer no Brasil inteiro. Devido a isso, Marcelo Pompêo escreveu o artigo O controle da flora e fauna aquáticas pela Resolução Conama que procura mostrar a irresponsabilidade de adotar esse tipo de gestão para o Brasil inteiro.

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