Estudo defende que o ambiente da sala precisa ser explorado além da exposição individual do professor

Estudo defende que o ambiente da sala precisa ser explorado além da exposição individual do professor

Pesquisadora concluiu que a metodologia ativa interferiu positivamente no desempenho dos estudantes. Fonte: dexway.com

Por Nelson Niero Neto – nelson.niero.neto@gmail.com

“O professor não está limitado a ensinar. Ele precisa fazer da sala de aula um ambiente de aprendizado, mobilizando o estudante.” É o que acredita Iara Yamamoto, professora universitária que ministra disciplinas ligadas à administração e marketing. Em seu mestrado, pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, ela avaliou a interferência das metodologias ativas de aprendizagem no desempenho dos estudantes.

Ela garante que não adianta uma aula ter várias horas de exposição individual do professor se os alunos não estiverem realmente interessados e puderem aplicar aquele conteúdo de alguma maneira significativa. “Não existe transmissão de conhecimento, simplesmente. A dedicação de quem participa do processo de aprendizagem é fundamental.”

Por isso, seu trabalho foi embasado no estudo de metodologias ativas de aprendizado. Elas baseiam-se na ideia de que o processo educativo precisa ser relacionado com o projeto de vida do discente, por meio de atividades práticas que valorizam sua capacidade de pensar. “Em outras palavras, essas metodologias são ferramentas para fazê-los trabalhar, em vez de apenas ficar horas ouvindo conteúdo. E, claro, eles precisam ver, no tema, alguma relação com o cotidiano, com a vida deles”, explica Iara. “Como professora, preciso incentivá-los para que eles tenham vontade de questionar e transformar a realidade”.

Mas Iara queria confirmar se essas técnicas realmente funcionam e são capazes de melhorar o desempenho dos alunos. Após estudar a literatura existente do assunto – etapa que serviu de referencial teórico para a pesquisa –, ela seguiu para o procedimento experimental.

Participaram da análise 107 universitários de duas instituições particulares, que acompanharam disciplinas ministradas por Iara durante um semestre. “Nós colocamos em prática o modelo de sala de aula invertida. Esse conceito, já abordado na literatura, fala do espaço como um ambiente de aprendizado dinâmico e interativo”, conta Iara. “Na prática, o estudante chega para a aula já tendo visto o conteúdo e está mais bem preparado para aplicar os conceitos e se envolver nas discussões”.

A exposição individual da professora não foi completamente abolida, mas grande parte do conteúdo era visto pelos alunos em cursos online fora do horário letivo, seguindo o modelo de sala de aula invertida. “Essa atividade era facultativa, e não fazê-la não interferia na nota final da disciplina. Mas constatei ao final do processo que a maioria dos envolvidos interagiu.”

A avaliação foi feita de diversas maneiras. “Se ela fosse feita apenas com provas tradicionais, poderia ocorrer uma condução tendenciosa da minha parte, tanto na formulação das perguntas, como na correção”, explica a professora. Assim, além de uma prova, foi desenvolvido um trabalho integral que envolvia todas as outras disciplinas do semestre, em que outros professores também foram avaliadores. “Isso evitou um possível viés pessoal.”

As atividades em sala de aula, ponto fundamental da metodologia ativa, também foram analisadas. “De vez em quando, sem aviso, eu verificava se os estudantes tinham feito o curso online da semana por meio de um quiz virtual”, conta. “Eles respondiam, em tempo real, com celulares e computadores. Essa etapa foi muito importante, pois eu identificava imediatamente o grau de dificuldade da sala, vendo o número de respostas certas e erradas. As dúvidas eram sanadas naquele momento”.

“Outra técnica era chegar na classe com um problema, baseado no conteúdo visto em casa, para ser resolvido”, explica. “É fundamental considerar que o estudante ter clicado em um vídeo não significa necessariamente que ele aprendeu. Eu tinha o controle de quem tinha assistido, mas era preciso debater e problematizar, para identificar o nível de aprendizagem.”

Ao final do processo, os participantes responderam dois questionários facultativos. “Para apresentar um resultado coeso, com validade estatística, utilizei essas escalas, consagradas na literatura”, explica. O primeiro estimava o grau de motivação do aluno: “Com ele, pude identificar duas variáveis interessantes: a razão de aquela  pessoa ir para a aula e o que ela almejava ali”.

O segundo focava no desempenho dos que participaram dos cursos online. “É um questionário específico para avaliar o nível de aprendizado em ambientes virtuais”.

Com as respostas, a pesquisadora identificou três grupos distintos de motivação. O primeiro era composto por estudantes que prezavam pela excelência acadêmica e pelo aprendizado. O segundo, majoritário, queria se formar para buscar uma boa carreira no futuro. E o terceiro, minoritário, era composto por alunos que desejavam aumentar sua competência profissional, mas sem muita motivação para se esforçar.

Comparando as notas finais dos estudantes e considerando seus grupos de motivação e local de ensino, Iara chegou às conclusões da dissertação.

“A metodologia ativa interferiu positivamente no desempenho de todos que participaram do processo, em relação aos que não se envolveram”, conta. “Além disso, percebi ao final da pesquisa que o tipo de turma pode ser uma variável relevante no aprendizado.”

Segundo a professora, a diferença entre as entidades de ensino participantes foi um fator influente no rendimento dos estudantes. Uma delas é mais preparada estruturalmente, com menos alunos por sala, enquanto a outra tem menos recursos e um número maior de pessoas por classe. A mensalidade da primeira também é maior, em relação à segunda.

“Os alunos da segunda instituição que almejam o diploma e uma boa carreira profissional estão inclinados a ver a aula como uma tarefa exclusiva do professor, ou seja, uma forma de ensino passiva”, explica Iara. “Isso chama muito a atenção, porque estudantes da outra instituição inseridos no mesmo grupo estão menos inclinados a pensar assim”.

Para a pesquisadora, uma das possíveis causas desse cenário é o grande número de universitários que precisa conciliar o trabalho com os estudos, e, por isso, chega para a aula, cansado e desmotivado. “Mas também existe a possibilidade do método que apliquei não ser o ideal para esse grupo de estudantes. Existem diversos tipos de metodologias ativas e o professor deve experimentá-las.”

Professor deve criar um ambiente que dê condições para o aprendizado e estimule o estudante
Fonte: cae.net

Iara garante que o modelo de ensino atual precisa mudar. “Não defendo o fim da aula expositiva, mas, sim, um novo tipo de aula, que também valoriza o trabalho do estudante. O professor deve criar um ambiente mais leve, que dê condições para o aprendizado e estimule a classe.” Ela observa, porém, que em relação aos estabelecimentos educacionais e o poder público, o docente é o elo mais fraco. “É imprescindível que exista apoio das instituições e a formulação de políticas públicas que dialoguem com essas novas metodologias. É hora de mudar, e entender que o aprendizado está muito além do ensino.”

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