Pesquisa destaca carência de áreas de lazer em São Paulo

Estudo da USP aponta precária oferta de equipamentos de lazer na cidade

Parque Pôr do Sol. Fonte: G1 - Globo. Reprodução

Por Vinícius Bernardes Mondin Guidio – vguidio@ig.com.br

Em 2015, o prefeito Fernando Haddad editou um decreto que alterou a condição da Praça Pôr do Sol, localizada no Alto de Pinheiros, para Parque Pôr do Sol, com objetivo de assegurar a preservação das áreas verdes do local. Tal medida visava impedir a continuidade da degradação observada na área, através da construção de infraestrutura que possibilitasse o adequado uso do espaço pela população. Entretanto, mesmo com a edição do decreto, a praça continua a apresentar uma elevada carência estrutural, como resultado de uma forte omissão governamental para com esse problema. Preocupada com questões dessa natureza, a pesquisa Análise comparativa da oferta e demanda de equipamentos de lazer na área central da cidade de São Paulo, coordenada pela professora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, Rita Giraldi, discute problemas ligados à precária infraestrutura da metrópole, destacando a reduzida oferta de lazer nos bairros da cidade.

Segundo a professora, tal estudo surgiu como um trabalho da disciplina “Espaço e equipamentos de Lazer”, ministrada por ela — inicialmente — para o curso de Turismo, com a proposta de analisar as deficiências presentes na infraestrutura da metrópole. Nessa perspectiva, a pesquisa foi desenvolvida, centrando-se em mapear os bairros da cidade de São Paulo e da circunvizinhança, por meio da identificação das principais carências estruturais — ligadas ao lazer — existentes nessas áreas. Amparado por entrevistas realizadas com os moradores das regiões analisadas, o estudo  conseguiu obter as necessidades mais expressivas de cada bairro, traçando um paralelo comparativo entre a oferta e a demanda dos serviços de entretenimento disponíveis hoje à população.

Tendo em vista esse panorama, o projeto conseguiu verificar as principais carências da metrópole, identificando como a negligência às necessidades sociais potencializa o déficit de instrumentos de lazer em São Paulo. Rita aponta que, a partir dos dados obtidos, foi possível organizar as informações no Ensinar com Pesquisa — programa de pesquisas da Pró-Reitoria da USP — a fim de se viabilizar a análise e a atualização dos dados relacionados aos aparelhos de lazer presentes em cada área.

De acordo com a pesquisa, observou-se que diversos bairros da metrópole possuem equipamentos de lazer — ainda que bastante reduzidos ou em precário estado de conservação. Porém, muitos desses se encontram ligados a interesses da iniciativa privada, não sendo totalmente acessíveis à grande maioria da população. Os altos valores cobrados para uso ampliam a atual carência de lazer da parcela mais pobre da sociedade, alimentando um cenário de exclusão. A professora ressalta que a ausência de aparelhos públicos de entretenimento (como parques e praças) eleva o custo de vida nas regiões, “camarotizando” determinados bairros — que passam a descartar aqueles que não conseguem se manter financeiramente no local. “Percebemos, ao longo do estudo, que não é que a localidade não apresente equipamentos [de lazer], mas muitos são da iniciativa privada, o que significa um ônus à população”, destaca Rita.

A professora exemplifica esse cenário com o caso da região da Berrini, em que a população da antiga favela Jardim Edite teve o custo de vida expressivamente elevado em função do processo de reurbanização da área. Apesar da melhora na moradia, diversos moradores destacaram que o ônus para se manter financeiramente no local os obrigou a deixar o bairro — resultando no deslocamento desses habitantes para outras comunidades. Na questão do lazer, Rita destaca que os equipamentos da região se mostravam inacessíveis a esse grupo, inclusive, os instrumentos que se encontravam nos próprios edifícios aos quais esses foram realocados. “Se o prédio tiver uma quadra, quem vai pagar pela manutenção dela? Quem vai pagar pela manutenção do elevador?”, avalia a professora, revelando um despreparo público em torno dessa questão.       

Modernização precoce e degradação

SÃO PAULO, SP, BRASIL, 21-01-2013, 10h: Agentes da secretaria de saúde tentam convencer usuários de crack a se internarem voluntariamente em clínicas de reabilitação no centro de São Paulo. (Foto: Marcelo Camargo/ABr)

A pesquisadora ressalta também a importância da região central das cidades para a dinâmica urbana. Conforme aponta, o centro, na grande maioria das vezes, é a área pioneira em investimentos de infraestrutura, sejam esses de natureza pública ou privada. Tal aplicação de capital — realizada no início do processo de modernização urbana — confere a essa região uma precoce verticalização e um maior desenvolvimento quando comparado as outras áreas da cidade. Entretanto, ao se encerrar a evolução do centro, os investimentos passam a se dirigir para regiões mais periféricas, de modo que a ausência de intervenções urbanísticas no local precursor das mudanças resulta em um processo de deterioração da infraestrutura da área.

Durante a realização da pesquisa, a professora conseguiu constatar os efeitos dessa negligência para com as regiões centrais. No bairro da Luz, a elevada degradação causada pelo uso do crack é retrato da falta de preocupação pública para com essas áreas, contribuindo para a deterioração do patrimônio da cidade. A professora destaca que, desde o início dos anos 80, há a ideia de revitalizar essa região, transformando-a em um “espaço de lazer e tempo livre”. Entretanto, tal proposta esbarra nos interesses da iniciativa privada e da especulação imobiliária que, na grande maioria das vezes, surgem como entraves a isso.

Rita aponta, ainda, a importância de intervenções urbanísticas como a realizada no Vale do Anhangabaú devido ao uso frequente da área no tempo livre da população. Para ela, o centro da cidade geralmente se apresenta como uma opção de lazer à sociedade, na medida em que esse possui recursos, muitas vezes, ausentes nas regiões periféricas. Desse modo, a modernização de tal espaço se torna fundamental para uma oferta adequada de equipamentos de entretenimento — acessíveis à população. No Anhangabaú, conforme destaca a professora, a atração de eventos culturais — como a Virada Cultural — demonstra a possibilidade de alteração do atual quadro, de modo que a oferta equilibre a demanda exigida pela metrópole. 

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