Funcionamento familiar influencia risco de tentativa de suicídio em pessoas com transtorno bipolar

Estudo revela que famílias de pacientes com pelo menos uma tentativa de suicídio apresentam pior desempenho em comunicação, solução de problemas, respostas afetivas e funcionamento geral

Foto: BBC Brasil

Por Letícia Fuentes – lepagliarini11@gmail.com

Para Mariangeles, que possui formação em psicologia mas apresentou a pesquisa como sua dissertação de mestrado pela FM, o funcionamento familiar é definido como “a forma como a família proporciona o ambiente adequado para o desenvolvimento e a sobrevivência dos membros da família nos níveis biológico, psicológico e social”. Segundo a pesquisadora, estudos anteriores sugerem que o funcionamento familiar de um paciente com transtorno afetivo bipolar é globalmente pior se comparado à família de um indivíduo sem a doença. “Quando trabalhamos em hospitais com pessoas que possuem transtorno afetivo bipolar, uma das coisas que mais nos preocupa é a alta porcentagem de tentativas de suicídio”, afirma. “Tanto que a metade dos pacientes tenta suicídio nas primeiras etapas da vida. Então, é importante que a gente entenda também um pouco do contexto no qual estão esses pacientes e o quanto a família pode ser um fator protetor contra o suicídio.”

Metodologia

Dos 62 pacientes com transtorno avaliados pela pesquisa, 31 possuíam ao menos um episódio de tentativa de suicídio, enquanto a outra metade não apresentava nenhuma tentativa no histórico. Os participantes foram submetidos a um questionário de avaliação, no qual respondiam algumas perguntas sobre funcionamento familiar e indicavam seus cuidadores. Analogamente, 60 cuidadores dos participantes – 29 familiares de pacientes com histórico de tentativas de suicídio e 31 familiares de pacientes sem episódios anteriores – foram avaliados por meio do mesmo questionário e os resultados foram comparados entre os grupos.

Ao observar as informações cruzadas, Mariangeles conta que percebeu uma associação entre os resultados dos pacientes com histórico de tentativas de suicídio e de seus cuidadores. “Pelo que pudemos identificar, pacientes com tentativa de suicídio apresentam um funcionamento familiar pior do que os outros que não têm esse histórico”, diz a pesquisadora. “A gente encontrou diferença significativa nos campos de solução de problemas, papéis, resposta afetiva, comunicação e funcionamento geral, das sete áreas avaliadas pela escala. Então a gente observou, sim, uma clara diferença no funcionamento familiar dos grupos.”

Desses critérios avaliados, Mariangeles conta que a hipótese de que o campo de “papéis” seria o mais prejudicado foi confirmada. “[A tentativa de suicídio] implica uma reorganização da família, da função de cada um dos membros, seja na questão da saúde, seja na consulta médica”, explica. “Já está comprovado que o prejuízo social do paciente é muito alto, pois muitos não conseguem trabalhar ou ter uma vida social ativa. Então o cuidador passa a ter de acompanhá-lo ao psiquiatra, ou no tratamento. Nesses casos, é necessário reestruturar a família.”

Segundo a autora da pesquisa, as famílias devem ficar atentas para identificar quando o funcionamento familiar está sendo prejudicado ou está afetando o tratamento do paciente com transtorno afetivo bipolar. “Os cuidadores podem identificar dificuldades na comunicação, na rotina familiar, no estresse ou na sobrecarga dos membros”, adiciona. “O que a família precisa é procurar ajuda, até para saber o que tem a ver com as características de cada indivíduo e o que tem a ver com o transtorno bipolar. Assim, eles vão conseguir ferramentas para auxiliar no tratamento desse paciente. Por isso nós acreditamos que é tão importante o trabalho com a família.”

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*